A Dança do Rapaz Branco é o primeiro romance de Paul Beatty — o primeiro norte-americano vencedor do Man Booker Prize com O Vendido, também editado pela Elsinore em 2017.
Gunnar Kaufman viveu a infância protegido na idílica tranquilidade branca de Santa Monica. Mas depois de Gunnar e as irmãs se recusarem a ir para um campo de férias para crianças negras porque se consideram diferentes dos outros negros, a mãe fá-los mudarem-se imediatamente para a zona oeste de Los Angeles, para que os filhos estejam em contacto com a “sua” cultura. E é assim que Gunnar, aspirante a poeta e acidental jogador de basquetebol, começa a descobrir a sua identidade, enquanto se move entre gangues, motins, estereótipos, na violência da vida negra nos Estados Unidos dos anos 90.
Um livro cheio de peripécias que traça um retrato paródico, por vezes exagerado mas sempre cómico, da vida deste jovem negro que parece representar, pela linhagem que carrega nos genes, e apresentada nas primeiras páginas na história da família que conta aos colegas, um culminar da história negra da América ao longo do século XX. Conforme reza a contracapa, esta obra «é uma comédia literária caleidoscópica sobre um afroamericano incomum à procura da sua identidade numa América caricatural mas, de algum modo, estranhamente familiar.»
«Se um magnata do cinema comprar os direitos cinematográficos da minha vida, a sinopse da Tv Guia dirá: Na luta pela liberdade, um jovem poeta relutante convence os negros americanos a abandonarem a esperança, e a matarem-se num final trágico e explosivo. Cheio de gargalhadas e diversão. Alguma violência e linguagem não indicada para crianças.» (pág. 10)
Paul Beatty vive em Nova Iorque e venceu o John Dos Passos Prize for Literature. Em 2016, venceu o Man Booker Prize com O Vendido, que foi também considerado um dos melhores livros de 2015 pela imprensa, em publicações como The New York Times Book Review ou The New Yorker. Ver artigo
Recomenda-se vivamente este livro da Dom Quixote que, curiosamente, foi publicado com uma requintada edição de capa dura, o que não é apanágio usual da editora (a não ser em edições especiais de algumas das mais recentes obras de António Lobo Antunes), além do uso da cor dourada sobre um fundo negro.
Amor Towles nasceu em Boston, formou-se em Yale e o seu primeiro romance, publicado em 2011, foi considerado como um dos melhores livros do ano pelo Wall Street Journal, traduzido para mais de 15 línguas e foram comprados os direitos de adaptação ao cinema. Este segundo romance, publicado em 2016, permaneceu 40 semanas no top de vendas do New York Times. Considerado o melhor livro do ano por diversas publicações e com os direitos de adaptação à televisão comprados em 2017, percebe-se o furor que o livro tem provocado. O escritor trabalhou durante 20 anos como investidor e dedica-se agora exclusivamente à escrita.
No dia 21 de Junho de 1922, o Conde Aleksandr Ilitch Rostov comparece no Kremlin perante a Comissão de Emergência do Comissariado do Povo para os Assuntos Internos, como que acusado de viver luxuosamente em tempos de mudança, onde a «classe ociosa» já não tem lugar nem um papel útil a sociedade. Perante o sonante nome desta personagem, somos transportados para as páginas dos livros de Tolstoi ou Dostoiévski, contudo o que predomina desde as primeiras páginas não é uma alma torturada pela época, mas sim uma alma livre, espirituosa, irreverente (ou não se sentisse dono do mundo onde vive) e que vive de forma mais ou menos diletante no luxuoso Hotel Metropol, com hora marcada todas as semanas no barbeiro, tendo prioridade perante quem já lá está, e tomando as suas refeições no restaurante Boiarski, onde o cozinheiro se permite indignar perante a capacidade do Conde conseguir detectar quais os ingredientes pobres que têm de ser utilizados como substitutos como substitutos numa boa receita em tempos de carestia e de frugalidade.
Há uma passagem que retrata bem o espírito desta leitura, como um libelo contra os tempos que se vivem:
«É bem verdade que um homem pode sentir-se completamente desfasado do seu tempo. Um homem pode ter nascido numa cidade famosa pela sua cultura idiossincrática e, no entanto, não compreender minimamente os hábitos, modas e ideias que exaltam essa cidade aos olhos do mundo. Avança pela vida fora, olhando à sua volta num estado de desconcerto, sem compreender as tendências, nem as aspirações dos seus pares.» (p. 107)
O humor e a ironia são claramente actuais: «embora os duelos tenham surgido como resposta aos crimes graves – deslealdade, traição e adultério -, em 1900 já tinham descido as escadas da razão em bicos dos pés e eram travados por causa da inclinação de um chapéu, da duração de um olhar ou da posição de uma vírgula.» (p. 60)
O que não belisca o prazer da leitura nem diminui a perícia do autor no reviver e reconstruir de uma época. Aliás as próprias notas do autor que surgem em rodapé são feitas na primeira pessoa do plural, como um “nós, os russos” que interage directamente com o leitor a partir do período retratado no livro. Esta é uma época dourada que está irrevogavelmente no seu ocaso e fazem do Conde Aleksandr um último sobrevivente. Ou talvez ainda haja surpresas?
O que é certo é que este nosso herói, mesmo quando se vê forçado a viver o resto da sua vida no hotel, não esmorece na compostura de um digno cavalheiro nem perde o sentido de humor ou o gosto pela vida nos gestos e acções mais simples. A intriga tem alguns saltos narrativos que nos fazem acompanhar a sua vida no Hotel Metropol primeiro como um solteiro bon vivant e depois como pai adoptivo da filha de uma jovem com quem travou amizade quando ela própria ainda era criança. Ver artigo
Entre a memória e a recriação fictícia da memória, passando pela história, pela arte e pela literatura, este livro marca a estreia na ficção desta autora nascida na Argentina. Correspondente do The New York Times em Buenos Aires, onde nasceu, colabora da revista Artforum e de um suplemento, tendo orientado cursos para artistas e ateliers de crítica de arte, co-editora de uma colecção sobre pintura argentina, e autora de um livro de ensaios sobre a arte argentina, María Gainza parece levar-nos pelas galerias da sua memória pessoal como quem nos conduz numa visita guiada a um museu: «na arte tudo se joga na distância que vai de algo que nos parece bonito a algo que nos cativa, e (…) as variáveis que modificam essa percepção podem e costumam ser as mais insignificantes.» (p. 11)
Conforme anunciado na contra-capa do livro: «Como num museu – lugar que, aliás, frequenta muitas vezes à maneira de uma sala de primeiros-socorros -, a sua vida tem obviamente obras-primas, mas também pequenos quadros escondidos em corredores escuros e estreitos. E, no entanto, todos eles importam.»
Um quadro, como uma memória, pode sempre revelar-se como um portal com duas saídas, uma para a história oficial e outra que se esconde sob a tela e apela directamente aos nossos sentidos. Como escreve a certa altura: «as coisas deste mundo parecem-me ambíguas, admitindo pelo menos duas leituras» (p. 24). Até porque como se interroga a autora: «também não sei porque estou a contar isto agora, mas suponho que é sempre assim: escrevemos uma coisa para contar outra» (p. 18)
A procura da identidade na arte é tão forte que a autora chega mesmo a encontrar um quadro que é a cópia de si própria na infância:
«Éramos ela e eu. A fascinação de me reconhecer foi a chave, não vou negar: aquela rapariga provocava-me indescritíveis excessos de ternura, queria correr a abraçá-la. Sei que as razões pelas quais me aproximei daquela pintura não passariam num exame da academia, essa casa dos espíritos sublimes onde o maior medo é fugir, mas não são afinal todas as boas obras pequenos espelhos? Não é verdade que uma boa obra transforma a pergunta «o que está a acontecer» em «o que me está a acontecer»? Não é toda a teoria também autobiografia?» (p. 128)
Entre a memória pessoal e o ensaio, com laivos de subtil perspicácia sobre a vida, a autora conta-nos na primeira pessoa como a sua vida se foi construíndo em torno da arte, enquanto nos fala da família ou de uma amiga de infância, ao mesmo tempo que reconta a vida de pintores como El Greco, Courbet ou Fujita, detendo-se particularmente nos momentos mais anedóticos ou inverosímeis, como que a desafiar a capacidade da realidade suplantar a ficção.
Este livro é ainda a prova de que a literatura latino-americana continua prolífica em ímpeto e em autores. Ver artigo
São sete os títulos da colecção da Bertrand em que diversos autores contemporâneos recriam uma obra de Shakespeare, com vista a celebrar Shakespeare. O quinto título da colecção lançada em cerca de 30 países é Semente de Bruxa, em que Margaret Atwood recria a peça A Tempestade. Esta autora canadiana tem dado muito que falar no último ano, com a adaptação para série televisiva de dois livros seus, História de uma serva e Alias Grace, encontrando-se já em produção mais duas adaptações das suas obras.
Felix é um director artístico no Festival de Teatro de Makeshiweg com produções ousadas que fazem com que o público saia cambaleante e ébrio, com cabeças de Macbeth ensopadas em sangue atiradas ao público, o Rei Lear nu em palco, ou Péricles encenado com naves espaciais.
Felix perdeu a mulher e a filha, aos 3 anos, com meningite. E mergulha por inteiro na encenação de Tempestade, aquela que será a sua melhor produção de sempre. Até ao dia em que é traído e afastado pela pessoa em quem mais confiava. A partir daí, Felix vive em reclusão, alucina com a sua filha Miranda, até que anos depois passa a trabalhar numa prisão como professor de literacia e mobiliza os seus alunos a representar Shakespeare.
Doze anos depois, Felix renasce assim como Próspero e tem a possibilidade de encenar finalmente o seu projecto outrora gorado, o que lhe permite também, dentro da prisão e com a ajuda dos presidiários que são seus alunos de teatro, encenar a sua vingança.
A autora abandona o género fantástico ou distópico que normalmente caracteriza as suas melhores obras, mas mostra versatilidade no tratamento do tema central à peça, ao mesmo tempo que atenta na forma como o próprio teatro precisa de ir sendo recriado para se manter actual e continuar a tocar os corações dos homens de hoje com temas e intrigas que foram criadas há séculos, celebrando-se assim, de forma justa, esse vulto maior do teatro mundial que foi, e permanece a ser, William Shakespeare. Ver artigo
Autora de obras de fantasia e de de ficção científica incontornáveis como o Ciclo Terramar (adaptado inclusive num filme de animação japonesa e também numa mini-série) ou A Mão Esquerda das Trevas, Ursula K. Le Guin faleceu em Janeiro de 2018, aos 88 anos de idade.
Autora de mais de 20 livros, com milhões de exemplares vendidos, traduzida em 40 línguas, Ursula K. Le Guin escreveu ainda ensaios e para cima de uma centena de contos.
Os Despojados, editado pela Saída de Emergência, é um dos seus principais livros, e forma, com A Mão Esquerda das Trevas, parte do Ciclo Hainish.
O livro é, mais do que um romance, uma reflexão sobre os sistemas políticos e sobre a identidade e liberdade individual face a culturas alienígenas, mesmo quando o outro é bastante próximo da espécie humana.
Shevek é um jovem físico brilhante, com uma descoberta que pode revolucionar a forma como se viaja no espaço, pois uma fracção de tempo de uma viagem no espaço continua a ser o equivalente a vários anos de vida que se perdem junto daqueles que se deixam para trás.
Shevek vive em Anarres (por vezes considerado um planeta gémeo, outras vezes um satélite ou Lua do planeta vizinho Urras) é convidado a continuar e a desenvolver o seu trabalho na física em Urras. Urras é um planeta próspero de recursos abundantes, onde vigora justamente um sistema capitalista e mesmo hedonista (note-se que o traje de cerimónia das mulheres é estarem despidas da cintura para cima apenas com algumas jóias incrustadas na pele).
Mas Urras, apesar da sua opulência e do cuidado na estética dos artefactos mais básicos, como o mobiliário, não é um planeta perfeito.
«A conversa prosseguiu. Era difícil para Shevek segui-la, tanto na linguagem como no conteúdo. Estava a ouvir falar de coisas das quais não tinha experiência nenhuma. Nunca vira uma ratazana, nem as casernas do exército, nem um asilo de loucos ou de pobres, nem uma loja de penhores, nem uma execução, nem um ladrão, nem um edifício de apartamentos, nem um cobrador de rendas, nem um homem que quisesse trabalhar e não pudesse arranjar emprego, nem um bebé morto numa vala. (…) Este era Urras (…) o mundo do qual os seus antepassados tinham fugido, preferindo-lhe a fome, o deserto, e o exílio interminável.» (p. 241)
Esta passagem recorda-nos como a ficção científica é sempre, por muito escapista e fantasiosa que se afigure, uma forma de escrever sobre o real ou imaginar mundos possíveis como escape ou alternativa melhor à realidade.
Anarres é um planeta desértico (e a capa da editora é brilhante na forma como retrata de modo simétrico essas duas paisagens em cima e em baixo) para onde alguns habitantes de Anarres partiram em tempos na busca de uma vida mais simples e mais regrada, apesar de terem de enfrentar a fome, o deserto, o exílio. A colónia fundada nesse planeta inóspito foi afinal, saberemos depois, uma experiência de comunismo não autoritário, que sobrevive há 170 anos.
Um dos momentos-chave do livro é o diálogo entre Shevek e uma embaixadora terrana, isto é, da Terra, o que resulta num debate filosófico ou político entre as semelhanças e diferenças entre estes três planetas tão similares.
É também particularmente interessante, e possivelmente está relacionado com o próprio estudo de Shevek na área da física e do tempo, a forma como os capítulos, descobriremos depois, não são sequenciais, apesar de assim parecer. Há uma certa distorção cronológica, em que os capítulos não seguem afinal a devida sequência temporal. Lembra um pouco o filme Arrival na forma como nos apresenta um tempo circular em que o futuro e o passado podem estar contidos no agora.
Em 2014, a autora recebeu a medalha National Book Foundation. Foi também distinguida ao longo da sua carreira de escrita com os Prémios Hugo, Nebula e World Fantasy. Ver artigo
Nunca me deixes, do autor Kazuo Ishiguro, Prémio Nobel de Literatura em 2017, cuja obra está publicada pela Gradiva, é considerado um dos melhores livros do autor mas corre o risco de ser tomado como um livro enganosamente simples.
Apesar de numa página introdutória, o autor situar a acção em «Inglaterra, finais da década de 90», este romance tem sido considerado como uma distopia, próxima da ficção científica.
A história está dividida em três partes: a infância de Kathy, Ruth e Tommy em Hailsham, um colégio interno na província inglesa, isolado do mundo; a adolescência ou início da idade adulta, na Herdade, aquilo que resta de uma quinta falida, com uma casa rural, e em redor palheiros, arrecadações e estábulos; a idade adulta, em que Kathy deixa a Herdade para trabalhar no mundo exterior como cuidadora.
Sem querer desvendar muito da intriga, pois o livro só ganha no mistério que vamos desvendando gradualmente e sempre de forma subtil, Nunca me deixes pode ser lido como uma alegoria sobre a vida e o amor.
Hailsham, como cenário idílico, relembra outros colégios internos sobre os quais lemos noutras obras de autores ingleses, como se toda a primeira parte do livro simbolizasse o decorrer do século XX. Os jovens aprendem como numa escola, lêem e debatem filosofia, mas é a arte e a criatividade que desempenha o principal papel. O único momento em que esta rotina parece ganhar vida é quando se dão as Vendas, em que os jovens reúnem todas as fichas que conseguiram juntar para trocar por objectos que, vistas bem as coisas, são perfeitamente inúteis mas que guardam como relíquias e que parecem dar cor à sua vida. Uma crítica a uma sociedade consumista que se foi impondo no decorrer do século XX? Uma reflexão sobre a importância da arte da beleza, nem que seja nalgum objecto estético que criamos ou adquirimos com desvelo?
Quando chegam à Herdade, Kathy (a narradora do livro, num registo discursivo na primeira pessoa que reforça a nossa afinidade com a personagem) reflecte acerca da tese que deve fazer, uma vez que saiu de Hailsham e está em fase transitória para ingressar no mundo exterior, contudo nunca faz a tese que aliás não é propriamente considerada um imperativo. Ao sair da Herdade, uma vez que o confronto entre Kathy e Ruth é inevitável, dispersam-se definitivamente as amizades criadas desde a infância e Kathy, agora com 30 anos, conhece o mundo do qual viveu protegida (ou melhor dizendo escondida), e enquanto aguarda que se cumpra o único propósito pelo qual nasceu (ou foi criada), como dadora, desempenha exemplarmente as funções de curadora, auxiliando outros dadores. Em suma, conhece uma vida feita de abnegação, trabalho, sofrimento e solidão, quando cresceu sempre rodeada de colegas e professores. Fica, no final, um travo melancólico de um amor, e de uma amizade, que quase se perdia em absoluto por causa do ciúme e da inveja.
O livro foi adaptado ao cinema em 2010 (o filme passou há dias na Fox Life), pelo realizador Mark Romanek, com interpretação de Carey Mulligan, Andrew Garfield e Keira Knightley. Ver artigo
John Fante não alcançou reconhecimento em vida, mas é hoje considerado um dos grandes autores da sua geração, notabilizado por Charles Bukowski o ter considerado como seu mentor.
É um pequeno livro, com cerca de 100 páginas, cujo discurso entre o lírico e o prosaico fazem desta obra uma pérola literária. Não falta uma boa dose de ironia e de humor, face às situações mais caricatas vivenciadas e provocadas pelo jovem herói. Com 17 anos, a um ano de terminar o liceu, Dominic Molise está desejoso de sair de casa e perseguir os seus sonhos de fama e riqueza como jogador de basebol. Ver artigo
Kazuo Ishiguro, publicado pela Gradiva e Prémio Nobel de Literatura em 2017, nasceu em Nagasáqui, Japão, em 1954, e vive na Grã-Bretanha desde os 5 anos. De toda a sua obra, Os Inconsolados é muito provavelmente a obra mais complexa e desafiante, podendo ser lido como uma metáfora sobre a vida.
Mr. Ryder é o convidado ardentemente esperado para dar um concerto numa cidade inominada, que pode ser em qualquer ponto da Europa, mas mais provavelmente algures na Alemanha. Sem programa, e com uma memória dúbia do que realmente está ali a fazer, o leitor vai captando o desenrolar da narrativa através da perspectiva amnésica desta personagem, e só gradualmente vamos percebendo que afinal Mr. Ryder, um ilustre maestro, está de regresso àquela que é a sua cidade-natal. As personagens com quem se vai cruzando, e que nunca dá mostras de reconhecer, acabam por se revelar amigos de infância. Nem mesmo quando encontra a mulher e o filho se Ryder demonstra sentir qualquer reconhecimento inicial.
Um livro intrigante, quase kafkiano, até pela forma labiríntica como vamos passando de uma situação para outra, e uma porta leva sempre a um sítio inesperado, como se num edifício desembocassem várias realidades paralelas, com uma natureza que tem tanto de sonho como da ilógica própria de Alice no País das Maravilhas (como quando num enterro a viúva pede que arranjem alguma coisa para servir o chá e os presentes começam a vasculhar os bolsos).
Um tributo à música e à arte. Uma reflexão sobre a vida. Um livro com mais de 400 páginas que se torna desafiante, mas igualmente intrigante, cativando o leitor que vai tentando desfiar o fio desse labirinto por onde o maestro se parece perder ao longo de três dias em que está de regresso à sua cidade-natal, onde irá ser a estrela de um importante concerto ao mesmo tempo que parece imbuído da missão de ajudar a comunidade a reencontrar a verdadeira arte. Ver artigo
Philip Pullman nasceu em Inglaterra em 1947, foi professor em Oxford e começou a escrever em 1985, alcançando sucesso uma década depois com a trilogia Mundos Paralelos (His Dark Materials), amplamente premiada, traduzida em mais de 40 línguas e com mais de 18 milhões de exemplares vendidos. O primeiro volume da saga foi adaptado ao cinema, com o título «A Bússola Dourada», e Nicole Kidman num dos principais papéis.
Quinze anos depois de Os Reinos do Norte ter sido publicado em Portugal, o autor regressa ao mundo encantado de Lyra, sob a chancela da Editorial Presença que tem publicado todos os livros na colecção infanto-juvenil Via Láctea e aproveitou, aliás, este novo livro para reeditar, com novas capas, os volumes anteriores: Os Reinos do Norte, A Torre dos Anjos e O Telescópio de Âmbar.
O Livro do Pó aparenta ser um retomar da trilogia, fazendo-nos recuar no tempo, mas o autor revelou em entrevistas que a acção é paralela. A história da trilogia anterior ficou encerrada, mas ainda há muito a dizer sobre a misteriosa matéria do Pó, e faz reviver a sua jovem heroína, Lyra Belacqua, começando por contar como ela em bebé passa a viver em Oxford, para depois avançar 10 anos em relação à conclusão de Mundos Paralelos.
Numa Inglaterra entre o clássico e o fantástico, o herói da história é agora Malcolm, um jovem aplicado, trabalhador, amigo e sensível, que vive com os pais, a quem ajuda com a sua estalagem, A Truta. Extremamente inquisitivo, quase sempre na companhia dos mais velhos, e sempre mantendo as mãos ocupadas, ajudando como pode nas mais variadas tarefas, Malcolm depara-se com uma surpresa. Numa das suas visitas ao priorado, descobre que as freiras têm a seu cargo uma misteriosa criança. Lyra é apenas um bebé mas Malcolm fica rendido aos seus encantos e torna-se no seu maior protector. Mais tarde, o nosso jovem herói é avisado de que haverá uma enorme inundação que colocará a região em perigo.
A obra tem um ritmo que, apesar de pretender acelerar com os desenlaces, parece resultar mais lento. No entanto, o universo fantástico está lá: feiticeiras, demónios, engenhos entre o mecânico e o mágico, deuses do rio, e os fantásticos génios com forma de animal que acompanham os humanos e parecem formar um só com eles, como se representassem a sua alma. É neste pormenor que reside a maior originalidade deste mundo encantado imaginado pelo autor. Estes génios acompanham permanentemente os humanos, muitas vezes pousados no seu ombro, com quem formam um par, como se fossem um só, capazes de adquirir formas de animais que se revelam úteis embora tenham uma forma que é normalmente aquela que preferem adoptar e que revela um pouco da sua verdadeira natureza. Asta, o génio de Malcolm, é muitas vezes uma ave.
Não se pense que esta obra é exclusivamente destinada ao público mais jovem. Dado o rigor na recriação de um ambiente histórico, passagens onde se aludem a actos sexuais que não parecem muito adequados aos mais novos, e por vezes alguma linguagem mais gráfica, o autor revela-se muito mais entretido com o acto de contar uma história à criança em nós que queremos manter desperta e interessada.
Aparentemente o segundo volume já se encontra escrito e o terceiro em vias de ser concluído, pelo que é possível que não tenhamos de aguardar muito tempo pelo desenlace da história. Ver artigo
Outono, o sétimo romance de Ali Smith, uma das escritoras britânicas mais aclamadas nos últimos anos, é um romance complexo que faz ainda uma subtil análise a um período actual e conturbado da história e da política inglesas, a questão do Brexit. Ali Smith nasceu em Inverness, na Escócia, em 1962 e vive em Cambridge. Publicado em Portugal pela Elsinore, este romance foi um dos finalistas do Man Booker Prize de 2017.
Elisabeth nasceu em 1984, e cria uma improvável amizade com Daniel, um homem mais velho que, aliás, tem já a idade do século, com 101 anos de idade. Pela forma como Daniel constantemente pergunta a Elisabeth o que está a ler, sempre que a vê, traçam-se assim os contornos de uma relação que não é de todo sexual, como aliás Elisabeth enfatiza a certa altura, mas socrática. Esta relação de amizade começa aliás quando Elisabeth tem apenas oito anos e a despeito das admoestações da mãe, para não incomodar o vizinho mais velho e certamente gay, a imaginação e a curiosidade e a retórica desta criança começarão a ser alimentadas por Daniel. E são esses diálogos entre os dois que versam de tudo um pouco, começando pela arte e a vida, que constituem não só as melhores partes do livro mas sim o próprio cerne deste fantástico romance.
Quando Daniel fica em coma numa instituição é Elisabeth que toma a si a responsabilidade de o assistir, como se fosse ela a familiar mais próxima (desconhece-se aliás que Daniel tenha alguma família), e faz-lhe companhia, lendo para si.
Este romance é o primeiro de uma tetralogia que parece começar no ocaso da vida para atravessar um ciclo através das quatro estações do ano. Winter, o próximo volume desta tetralogia, já se encontra publicado em inglês, pelo que esperamos que esteja prestes a sair a sua tradução. Ver artigo
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