Das séries que tenho visto nos últimos meses, Shogun está claramente no topo.

Vi o primeiro episódio assim que foi lançado, mas na altura achei a série demasiado lenta – talvez – e por esse ou algum outro motivo parei.

Nestas férias de Natal recomecei Shogun – a par das 3 temporadas do The Bear (curiosamente ambas as séries foram as que mais Globos arrecadaram).

Fiquei completamente fascinado. Os cenários, as paisagens do Japão, sempre com algum castelo ou templo a irromper, o ambiente de época, tudo é exemplar nesta série. Este é um retrato, ficcional claro, sobre o Japão do século XVI, que explora a presença dominante portuguesa, e da igreja, em território nipónico, num tempo em que Portugal e Espanha dividem o mundo entre si, e tentam afastar qualquer concorrência… até que um piloto inglês, constantemente apontado como um “pirata”, desembarca de forma desastrosa no Japão com diários cheios de informações comprometedoras sobre uma base em Macau.

O maior trunfo da série é, provavelmente, o seu maior desafio. Esta é uma série quase toda falada em japonês – quando não se fala “português”, que é, na verdade, inglês… Há também pelo menos 2 atores portugueses na série – o sobejamente reconhecido Joaquim de Almeida, cuja voz se distingue logo, ainda antes de lhe vermos claramente o rosto, numa cela de prisão, e um outro (Paulino Nunes) cuja pronúncia, ao falar inglês, facilmente o denuncia como sendo luso, e ainda o Louis Ferreira.

Mas, dizia eu, um dos grandes trunfos da série é também uma possível dificuldasde… é que, além da questão da língua, esta é uma série que retrata exemplarmente toda uma cultura – aliás, é uma excelente série sobre choque cultural – o episódio do faisão é emblemático. Ou seja, para ver Shogun tem de haver verdadeiramente disponibilidade mental e emocional, pois entramos num ritmo muito próprio do Japão, em que tudo desacelera, em que cada gesto, cada palavra, cada olhar é carregado de intenção e significado, quase sempre num ritmo lento – mas sim, também há tiros, e guerras, e muitas cabeças a rolar.

Das quatro estatuetas que a série da FX ganhou, como Melhor Série, Melhor Ator para Hiroyuki Sanada e Melhor Ator Secundário para Tadanobu Asano, é perfeitamente justo que Anna Sawai (Mariko-sama) tenha ganho Melhor Atriz, mais que não fosse pela sua maneira de andar – aliás de deslizar. O penúltimo episódio da série, extremamente dramático, toma a sua personagem como central à intriga, e é absolutamente devastador.

Depois da série homónima de 1980, com 5 episódios, esta nova série, com quase 10 horas – cada episódio demora 1 horas -, volta a adaptar o romance de James Clavell – cujo primeiro volume está publicado pela Cultura Editora.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.