Umberto Eco, escritor e erudito italiano, nasceu a 5 de Janeiro de 1932 em Alessandria (Piemonte). Pouco se sabe sobre a sua infância, a não ser que se doutorou pela Universidade de Turim com apenas vinte e dois anos de idade, apresentando uma tese consagrada ao pensamento filosófico de São Tomás de Aquino intitulada «O Problema Estético em S. Tomás de Aquino». Entre 1954 e 1959 desempenhou as funções de editor cultural na cadeia de televisão estatal italiana RAI. Leccionou nas universidades de Turim, Milão e Florença e no Instituto Politécnico de Milão. Tinha trinta e nove anos de idade quando foi nomeado professor catedrático de Semiótica pela Universidade de Bolonha, a mais conceituada de Itália. Destacara-se como filósofo, medievalista e semiólogo, quando se estreou na narrativa com O Nome da Rosa. O romance possui uma pequena ressalva introdutória de que se trata de um texto verídico: um estudioso terá descoberto por acaso a tradução francesa de um manuscrito do século XIV. O autor do manuscrito é um monge beneditino alemão, Adso de Melk, que narra, no fim da sua vida, um estranho caso vivido na adolescência. A história decorre no ano de 1327, na Idade Média, período que poderemos verificar adiante é caro a Umberto Eco. Guilherme de Baskerville, um franciscano inglês, e o jovem Adso, chegam a uma abadia beneditina onde se irão reunir importantes teólogos ao serviço do Papa e do Imperador mas subitamente vêem-se envolvidos numa história policial. Note-se aliás na ironia do nome Guilherme de Baskerville que traz ao leitor associações a O cão dos Baskerville, um romance policial de Sir Arthur Conan Doyle onde figuram nada mais nada menos que Sherlock Holmes e Watson. Guilherme de Baskerville e o jovem Adso armam-se assim em detetives amadores, tentando desvendar este mistério que envolve a morte por envenenamento de um monge, que surge com a ponta do dedo e a ponta da língua roxas, num mosteiro fechado ao mundo onde ocorrem sete crimes em sete dias, e tudo parece girar em torno um manuscrito proibido que se esconde na biblioteca labírintica da abadia, com acessos secretos e onde os corredores parecem não levar a lado nenhum. Muito antes do sucesso de romances como O código da Vinci, O Nome da Rosa foi um verdadeiro êxito editorial que foi depois adaptado ao cinema, com Sean Connery no principal papel.
Baudolino é um romance que mais uma vez versa o medieval, sobre um pequeno camponês fantasioso e mentiroso. Numa história rocambolesca e pícara, este anti-herói passa a vida a inventar mas, como que por milagre, tudo o que imagina produz História, e conquista mesmo o imperador Frederico Barbarroxa que o adota.
A Misteriosa Chama da Rainha Loana conta como um alfarrabista de Milão sexagenário luta por recuperar a memória após um AVC. Yambo lembra-se de cada livro que leu mas não se lembra do próprio nome ou da sua infância nem reconhece a família. Como forma de recuperação de si próprio, volta à casa de campo da sua infância, onde descobre livros, álbuns de banda desenhada, revistas, discos de outros tempos, religiosamente guardados, e começa uma viagem em que se percebe como o poder da ficção e da cultura que nos envolve é tão determinante como os episódios históricos e pessoais que vivemos. Este é talvez um dos livros mais pessoais ou nostálgicos do autor, bem como profundamente inovador.
O Cemitério de Praga situa-se no século XIX, entre Turim, Palermo e Paris, e conta a história de um espião que condena tudo e todos mas que é ele próprio uma personagem execrável. Ao estilo de um romance-folhetim, cruza personagens e situações que aconteceram efetivamente, em torno de uma personagem fictícia cujos feitos são também eles fatuais apesar de muitas vezes desprezíveis, como é o caso da falsificação conhecida como «Os Protocolos dos Sábios Anciãos de Sião», que iria depois inspirar a Hitler a criar os campos de concentração do Holocausto.
Entre as suas numerosas obras ensaísticas, podemos destacar Os Limites da Interpretação, A Passo de Caranguejo, Construir o Inimigo e outros escritos ocasionais, Obra Aberta, Sobre Literatura e o famoso guia académico Como se Faz uma Tese em Ciências Humanas.
Organizou ainda os livros ilustrados e ricos em informação histórica intitulados História da Beleza, História do Feio e A Vertigem das Listas, e mais recentemente coordena em três volumes um importante estudo sobre a Idade Média, cruzando a sociedade, a arte, a espiritualidade, a filosofia e a ciência desse período comummente tido como obcuro e erradamente apelidado de a Idade das Trevas.
O último romance de Umberto Eco intitula-se Número Zero e trata justamente de uma equipa de seis redactores, sem grande experiência aliás no jornalismo, criada à pressa com vista à edição de lançamento de um jornal. O jornal chama-se «Amanhã» justamente por não lidar com as notícias do que aconteceu na véspera mas sim com o que ainda irá acontecer: «as notícias do dia anterior já nós as sabemos pela televisão às oito da noite, pelo que os jornais contam sempre as coisas que já sabemos, e é por isso que vendem cada vez menos. No Amanhã, a estas notícias que já cheiram mal como o peixe será certamente oportuno resumi-las e relembrá-las, mas bastará uma colunazinha, que se leia em poucos minutos.» (p. 28).
O romance narrado na primeira pessoa pela voz de Colonna, um escritor fantasma, inicia com uma nota de alerta, datada de Junho de 1992, no momento em que a vida de Colonna parece encontrar-se ameaçada, à semelhança do que terá acontecido com Simei, o director do jornal, que desapareceu sem deixar rasto. Só depois recuamos até ao mês de Abril do mesmo ano, durante o período em que se constituíu a equipa de redacção e se delineiam as características do jornal. Da equipa de redactores destaca-se Braggadocio, um redactor paranóico que vai conjecturando obsessivamente uma teoria da conspiração em torno do cadáver de Mussolini, acreditando que o Duce nunca terá morrido, e é também no espaço da redacção que Colonna conhece a jovem Maia, quase licenciada em Letras, que trabalhava numa revista de mexericos e com quem se irá envolver amorosamente.
Este curto livro, o mais pequeno romance de Eco até à data, constitui-se assim como uma crítica ou reflexão do que é o jornalismo actualmente, constituindo-se, conforme refere a contracapa, como um «manual perfeito para o mau jornalismo que, gradualmente, nos impossibilita de distinguir uma invenção de um directo»: «Habitualmente, mesmo para um jornal verdadeiro, a solução mais prudente é puxar para o lado sentimental, ir entrevistar os parentes. Se estiverem atentos, é assim que fazem as televisões, quando vão tocar à porta da mãe a quem meteram o filho de dez anos nos ácidos: senhora, o que sentiu com a morte do seu menino? Humedecem-se os olhos das pessoas e fica tudo satisfeito. Existe uma bela palavra alemã, Schadenfreude, o prazer com a desgraça alheia. É este sentimento que um jornal deve respeitar e alimentar.» (p. 114).
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