Se já estava expectante com este Membranas, de Chi Ta-Wei, publicado pela Editorial Presença, quando o abri e vejo que a tradução é de Nuno Quintas, fiquei ainda mais entusiasmado.

Este romance, que pode ser designado de “ficção científica queer”, que surge três décadas depois da publicação original, parece mais atual ainda, ao apresentar uma narrativa futurística, distópica até, sobre a vida no Planeta Terra em 2100, numa era em que se vive debaixo de água, e em que tudo parece depender de membranas, isto é, de uma fina película que pode rodear os nossos corpos, ou até mesmo os nossos corações – por exemplo, quando nos refugiamos em rotinas…

A personagem central é Momo, uma jovem esteticista, a quem a mãe contou que ela nasceu de dentro de um pêssego, e que, no desenrolar da narrativa, passa a lembrar a sua infância, causando um questionar da sua identidade, da memória, do que é a realidade.

O livro parte de premissas interessantes, e, especialmente se considerarmos que tem mais de 30 anos, antecipa um futuro plausível, dentro dos “mundos possíveis” que a ficção científica por vezes antecipa, ao colocar a hipótese de o futuro da Humanidade ser justamente sob a superfície, dentro do elemento que tanto distingue o planeta Terra, isto é, considerando a hipótese de o futuro da Humanidade ser viver no oceano. É também um livro sobre questões de identidade de género, e da mudança de sexo, ainda que de forma críptica, mais indiciada do que clarificada.

Nascido em 1972, Chi Ta-wei formou-se em Línguas Estrangeiras na Universidade Nacional de Taiwan e doutorou-se em Los Angeles, na Universidade da Califórnia. Conhecido e reconhecido pela sua escrita de ficção, pelo seu conhecimento aprofundado sobre a história da Literatura LGBT Taiwanesa e pelo seu trabalho de tradutor – em que se incluem traduções para inglês de Italo Calvino, por exemplo -, o autor é hoje lido em várias línguas, sobretudo pelas edições de Membranas, um título que já conquistou um lugar de destaque na ficção científica queer um pouco por todo o mundo.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.