Civilizações, de Laurent Binet, publicado pela Quetzal, com tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra, apresenta-se, e lê-se, como um romance mas, não fosse a sua capacidade efabulatória, ao recriar a história da Europa, aproxima-se mais de um ensaio pelo registo sóbrio e fatual, com intromissões muito pontuais do narrador. Ver artigo
Em 1768 uma expedição deixou a Inglaterra sob o comando do capitão James Cook e regressou em 1771, depois de fazer o reconhecimento de várias ilhas do Pacífico e visitar a Austrália e a Nova Zelândia. Nos cem anos subsequentes, as terras mais férteis foram retiradas aos seus ocupantes, os aborígenes na Austrália e os maoris na Nova Zelândia, cuja população decresceu em 90 % e foram racialmente discriminados. Na Tasmânia, os nativos depois de viverem 10.000 anos em isolamento, foram completamente exterminados. Não sobrou ninguém. Mesmo depois de mortos, os seus corpos foram profanados e estudados por antropólogos e curadores de museus.
Neste magnífico novo romance, publicado pela Sextante, talvez um dos melhores da carreira de Peter Carey, autor nascido na Austrália que vive actualmente em Nova Iorque, duas vezes premiado com o Booker Prize, a intriga remonta a 1954, depois da Segunda Guerra Mundial portanto. Em capítulos alternados na primeira pessoa, entre Irene Bobs, a mulher de Titch, o melhor vendedor de carros do sudoeste da Austrália, e Willie Bachhuber, um jovem alemão, louro e bonito de 26 anos, em fuga à justiça, um mestre-escola suspenso, rato de biblioteca e vencedor (sem prémio) de um conhecido concurso radiofónico de cultura geral, o autor faz uma longa circunvolução na primeira parte do romance, isto é, em 160 páginas, o que constitui quase metade do livro. Percebemos, gradualmente, e conforme as personagens vão sendo despidas e reveladas na sua densidade psicológica, que a narrativa nos prepara para a eminente viagem em torno da Austrália, pois Titch quer a todo o custo entrar na Prova Redex Trial, ao ponto de convencer a mulher a juntar-se-lhe, para o poder controlar neste seu arroubo, se bem que ela própria percebe de carros e é boa condutora. E é também imediatamente antes da narração da viagem, uma corrida em volta do continente australiano à velocidade de 50 milhas por horas a que poucos carros sobrevivem, ficando atravessados na paisagem inóspita como carcaças, que percebemos afinal o segredo que Willie guarda. Note-se quando logo no início do romance ele se apresenta a Irene Bobs, sua vizinha: «Eu sou Willie Bachhuber, disse eu, porque a guerra tinha terminado há menos de dez anos e era melhor arrumar logo com a questão alemã.» (p. 20) Mas não é esse o segredo do nosso Willie, um jovem que fugiu à mulher e aos pais, a partir do momento em que o médico num esgar lhe mostra o filho, que nasceu negro e de cabelo preto.
Na última parte do romance, que se chama justamente «Uma bifurcação na estrada», temos 140 páginas de desfecho, em que a prova Redex – que primeiro serviu para apresentar o continente na sua magnitude e nos seus perigos, assim como o seu tecido social complexo e racista – é quase esquecida, conforme o romance dá uma guinada súbita para algo que foi sendo indiciado muito subtilmente, e apanha todos de surpresa, o leitor e a própria personagem que desconhecia as suas verdadeiras origens. Há pistas, naturalmente, como quando Irene Bobs encontra a caveira de uma criança na terra e tenta entregá-la às autoridades.
O narrador declarou em entrevista que há muito tempo que evitava abordar o tema do racismo, pois achava que não era essa a função de um escritor branco, mas neste seu décimo quarto romance, e o mais ousado, percebeu que não podia continuar a fugir à evidência de ser um escritor australiano branco beneficiário de um genocídio.
O final do romance tem alguma coisa de mito, e o próprio título ganha um sentido que vai além da corrida Redex, na forma como depois de descobrir a sua verdadeira origem étnica, aparentemente óbvia para todos os outros com que se confrontava, um mestiço (que se julgava branco) que em criança foi levado por uma águia passa a viver como um aborígene, enquanto procura preservar o legado cultural desse povo em extinção, a «registar a verdade e manter o segredo» (p. 396) e educar a geração mais nova de puros nativos.
«O meu pai pode ter sido, como tantos deram a entender, um bem-intencionado antropólogo amador abelhudo, mas era também um homem instruído e muito culto, um intelectual cuja alma tinha sido seriamente deformada devido à prática de limpeza étnica do seu país.» (p. 391)
Neste magnífico novo romance, publicado pela Sextante, talvez um dos melhores da carreira de Peter Carey, autor nascido na Austrália que vive actualmente em Nova Iorque, duas vezes premiado com o Booker Prize, a intriga remonta a 1954, depois da Segunda Guerra Mundial portanto. Em capítulos alternados na primeira pessoa, entre Irene Bobs, a mulher de Titch, o melhor vendedor de carros do sudoeste da Austrália, e Willie Bachhuber, um jovem alemão, louro e bonito de 26 anos, em fuga à justiça, um mestre-escola suspenso, rato de biblioteca e vencedor (sem prémio) de um conhecido concurso radiofónico de cultura geral, o autor faz uma longa circunvolução na primeira parte do romance, isto é, em 160 páginas, o que constitui quase metade do livro. Percebemos, gradualmente, e conforme as personagens vão sendo despidas e reveladas na sua densidade psicológica, que a narrativa nos prepara para a eminente viagem em torno da Austrália, pois Titch quer a todo o custo entrar na Prova Redex Trial, ao ponto de convencer a mulher a juntar-se-lhe, para o poder controlar neste seu arroubo, se bem que ela própria percebe de carros e é boa condutora. E é também imediatamente antes da narração da viagem, uma corrida em volta do continente australiano à velocidade de 50 milhas por horas a que poucos carros sobrevivem, ficando atravessados na paisagem inóspita como carcaças, que percebemos afinal o segredo que Willie guarda. Note-se quando logo no início do romance ele se apresenta a Irene Bobs, sua vizinha: «Eu sou Willie Bachhuber, disse eu, porque a guerra tinha terminado há menos de dez anos e era melhor arrumar logo com a questão alemã.» (p. 20) Mas não é esse o segredo do nosso Willie, um jovem que fugiu à mulher e aos pais, a partir do momento em que o médico num esgar lhe mostra o filho, que nasceu negro e de cabelo preto.
Na última parte do romance, que se chama justamente «Uma bifurcação na estrada», temos 140 páginas de desfecho, em que a prova Redex – que primeiro serviu para apresentar o continente na sua magnitude e nos seus perigos, assim como o seu tecido social complexo e racista – é quase esquecida, conforme o romance dá uma guinada súbita para algo que foi sendo indiciado muito subtilmente, e apanha todos de surpresa, o leitor e a própria personagem que desconhecia as suas verdadeiras origens. Há pistas, naturalmente, como quando Irene Bobs encontra a caveira de uma criança na terra e tenta entregá-la às autoridades.
O narrador declarou em entrevista que há muito tempo que evitava abordar o tema do racismo, pois achava que não era essa a função de um escritor branco, mas neste seu décimo quarto romance, e o mais ousado, percebeu que não podia continuar a fugir à evidência de ser um escritor australiano branco beneficiário de um genocídio.
O final do romance tem alguma coisa de mito, e o próprio título ganha um sentido que vai além da corrida Redex, na forma como depois de descobrir a sua verdadeira origem étnica, aparentemente óbvia para todos os outros com que se confrontava, um mestiço (que se julgava branco) que em criança foi levado por uma águia passa a viver como um aborígene, enquanto procura preservar o legado cultural desse povo em extinção, a «registar a verdade e manter o segredo» (p. 396) e educar a geração mais nova de puros nativos.
«O meu pai pode ter sido, como tantos deram a entender, um bem-intencionado antropólogo amador abelhudo, mas era também um homem instruído e muito culto, um intelectual cuja alma tinha sido seriamente deformada devido à prática de limpeza étnica do seu país.» (p. 391)
Ungulani Ba Ka Khosa é dos escritores moçambicanos mais reconhecidos da sua geração. Francisco Esaú Cossa nasceu a 1 de Agosto de 1957 em Inhaminga, na província de Sofala, membro da tribo étnica Tsonga e falante da língua Tsonga, e adoptou como “pseudónimo” o seu nome Tsonga. Formado em Direito e em Ensino de História e Geografia, exerce actualmente as funções de director do Instituto Nacional do Livro e do Disco. É membro e secretário-geral da Associação dos Escritores Moçambicanos.
Gungunhana é um livro que reúne Ualalapi, o romance de estreia de Ungulani Ba Ka Khosa, publicado em 1987 e eleito como um dos cem melhores romances africanos do século XX, e As Mulheres do Imperador, uma nova novela deste autor moçambicano que constitui um regresso a este universo romanesco. Este livro assinala assim trinta anos de escrita ao mesmo tempo que o autor parece fechar um ciclo. Ualalapi narra o fim do império de Ngungunhane, último imperador de Gaza que resistiu ferozmente aos portugueses, entre 1884 e 1895, até que foi feito prisioneiro por Mouzinho de Albuquerque, levado para Lisboa e depois exilado para os Açores.
Ungulani Ba Ka Khosa explora nesta obra, na linha dos sul-americanos, o imaginário mítico do seu país. A obra situa-se entre o conto e o romance, constituída por seis partes, mas sem ser uma narrativa fragmentária. As seis narrativas entretecem-se como unidades in(ter)dependentes, cada uma antecedida por um pequeno texto, intitulado «Fragmentos do fim», textos esses que se encontram numerados de um a seis, numeração essa que parece marcar também a própria evolução histórica que se sente até chegar à queda do império. Esses pequenos fragmentos constituem um levantamento feito a partir de fontes históricas, escritas na óptica do colonizador. Contribuem para esta paródia intertextual o acrescento de citações bíblicas (Job 2, Apocalipse 3, Mateus 6), na precedência de quatro dos contos, frases aforísticas referentes a Ngungunhane, citações de fontes fictícias da autoria do próprio autor e um dos textos trata-se de um fragmento mínimo do discurso de Ngungunhane, antes de embarcar para o exílio. Através da intertextualidade entramos assim no domínio da metaficção historiográfica, como modo de questionar o passado e o presente. Há ainda uma valorização da oralidade, patente no próprio facto de o narrador ser um jovem que mexe em papéis e ouve um velho, junto a uma fogueira, a transmitir uma estória que, por sua vez, lhe foi contada pelo avô.
As Mulheres do Imperador, uma novela com pouco menos de cem páginas, é – conforme anunciado na contracapa – um tributo ao papel das mulheres na História, neste caso as favoritas da corte do imperador, «sempre secundarizadas pela História». Mas, na verdade, as mulheres já estavam bem presentes em Ualalapi, até porque é quase sempre a partir da perspectiva do outro que o autor constrói aos nossos olhos a figura do mítico imperador. O que se configura nesta nova novela é o fim definitivo do império, quinze anos depois, quando as mulheres do imperador regressam do seu exílio em S. Tomé a Lourenço Marques, para testemunhar o início de uma nova época, quando os nativos vivem completamente subjugados e dominados pelo colono, e novos bairros começam a surgir em torno da cidade, conforme os pretos vão sendo empurrados para bairros fora da cidade, como o da Mafalala, ao mesmo tempo que assimilam uma nova cultura. O narrador esquece muitas vezes essas mulheres que toma como personagens centrais, para nos dar, uma vez mais, uma perspectiva dispersa e fragmentada ou complementada por diversos olhares. As características que tornam a escrita de Ungulani Ba Ka Khosa tão peculiar e interessante estão também bem presentes nesta obra, como, por exemplo, a forma como muitas vezes recorre a termos das línguas locais para designar algo, explicando depois ao leitor o equivalente semântico da palavra ou qual o significado e/ou origem da palavra, ou ainda os diálogos entre as personagens, que muitas vezes consistem numa réplica sucessiva de provérbios, geralmente alusivos aos animais e à natureza. A linguagem de Khosa é imaginativa, visual, densa, violenta, o que por vezes se revela de forma chocante, de forma a transluzir uma forte carga simbólica e mito-poética, conforme à tecitura poética do maravilhoso e do realismo mágico.
Gungunhana é um livro que reúne Ualalapi, o romance de estreia de Ungulani Ba Ka Khosa, publicado em 1987 e eleito como um dos cem melhores romances africanos do século XX, e As Mulheres do Imperador, uma nova novela deste autor moçambicano que constitui um regresso a este universo romanesco. Este livro assinala assim trinta anos de escrita ao mesmo tempo que o autor parece fechar um ciclo. Ualalapi narra o fim do império de Ngungunhane, último imperador de Gaza que resistiu ferozmente aos portugueses, entre 1884 e 1895, até que foi feito prisioneiro por Mouzinho de Albuquerque, levado para Lisboa e depois exilado para os Açores.
Ungulani Ba Ka Khosa explora nesta obra, na linha dos sul-americanos, o imaginário mítico do seu país. A obra situa-se entre o conto e o romance, constituída por seis partes, mas sem ser uma narrativa fragmentária. As seis narrativas entretecem-se como unidades in(ter)dependentes, cada uma antecedida por um pequeno texto, intitulado «Fragmentos do fim», textos esses que se encontram numerados de um a seis, numeração essa que parece marcar também a própria evolução histórica que se sente até chegar à queda do império. Esses pequenos fragmentos constituem um levantamento feito a partir de fontes históricas, escritas na óptica do colonizador. Contribuem para esta paródia intertextual o acrescento de citações bíblicas (Job 2, Apocalipse 3, Mateus 6), na precedência de quatro dos contos, frases aforísticas referentes a Ngungunhane, citações de fontes fictícias da autoria do próprio autor e um dos textos trata-se de um fragmento mínimo do discurso de Ngungunhane, antes de embarcar para o exílio. Através da intertextualidade entramos assim no domínio da metaficção historiográfica, como modo de questionar o passado e o presente. Há ainda uma valorização da oralidade, patente no próprio facto de o narrador ser um jovem que mexe em papéis e ouve um velho, junto a uma fogueira, a transmitir uma estória que, por sua vez, lhe foi contada pelo avô.
As Mulheres do Imperador, uma novela com pouco menos de cem páginas, é – conforme anunciado na contracapa – um tributo ao papel das mulheres na História, neste caso as favoritas da corte do imperador, «sempre secundarizadas pela História». Mas, na verdade, as mulheres já estavam bem presentes em Ualalapi, até porque é quase sempre a partir da perspectiva do outro que o autor constrói aos nossos olhos a figura do mítico imperador. O que se configura nesta nova novela é o fim definitivo do império, quinze anos depois, quando as mulheres do imperador regressam do seu exílio em S. Tomé a Lourenço Marques, para testemunhar o início de uma nova época, quando os nativos vivem completamente subjugados e dominados pelo colono, e novos bairros começam a surgir em torno da cidade, conforme os pretos vão sendo empurrados para bairros fora da cidade, como o da Mafalala, ao mesmo tempo que assimilam uma nova cultura. O narrador esquece muitas vezes essas mulheres que toma como personagens centrais, para nos dar, uma vez mais, uma perspectiva dispersa e fragmentada ou complementada por diversos olhares. As características que tornam a escrita de Ungulani Ba Ka Khosa tão peculiar e interessante estão também bem presentes nesta obra, como, por exemplo, a forma como muitas vezes recorre a termos das línguas locais para designar algo, explicando depois ao leitor o equivalente semântico da palavra ou qual o significado e/ou origem da palavra, ou ainda os diálogos entre as personagens, que muitas vezes consistem numa réplica sucessiva de provérbios, geralmente alusivos aos animais e à natureza. A linguagem de Khosa é imaginativa, visual, densa, violenta, o que por vezes se revela de forma chocante, de forma a transluzir uma forte carga simbólica e mito-poética, conforme à tecitura poética do maravilhoso e do realismo mágico.
Vamos dar conta das novidades em trânsito. Acaba de ser lançada uma nova tradução e edição da obra maior de Aleksandr Soljenítsin, O arquipélago Gulag, traduzida directamente do russo por António Pescada e tratando-se de uma versão abreviada. A Sextante tem aliás publicado as outras obras do autor.
Segundo informa a Sextante, na sua nota de imprensa, este «é um livro de condenação da existência dos campos de trabalho forçado e extermínio da União Soviética», «uma obra emblemática de combate ao totalitarismo de face estalinista, acerca da dura vida nos campos de extermínio e trabalhos forçados soviéticos. Escrito clandestinamente de 1958 a 1967, o manuscrito de O arquipélago Gulag acabou por ser descoberto pelo KGB em 1973. Na sequência disso, Soljenítsin, que entretanto havia sido galardoado com o Prémio Nobel da Literatura, decide publicar o livro no estrangeiro. Uma primeira edição em russo é publicada em Paris ainda em 1973, sendo no ano seguinte lançada uma edição em francês. Soljenítsin é entretanto preso, acusado de traição, despojado da nacionalidade soviética e enviado para o exílio, onde estará vinte anos, até ao seu regresso à Rússia, em 1994. Para realizar este extraordinário livro, Soljenítsin foi ajudado pelo testemunho de 227 sobreviventes dos campos do Gulag, tendo ele próprio estado no de Ekibastuz, no Cazaquistão (campo descrito no romance Um dia na vida de Ivan Deníssovitch – Sextante Editora, 2012). O livro agora publicado pela Sextante é a versão abreviada, num só volume, preparada por Soljenítsin e por sua mulher, Natália – que, de resto, assina o prefácio –, com o objetivo de se tornar mais acessível aos leitores estrangeiros e a novos leitores que, como ele, deverão «condenar publicamente a ideia de que homens possam exercer tal violência sobre outros homens. Calando o mal, fechando-o dentro do nosso corpo para que não saia para o exterior, afinal semeamo-lo».
Sobre o autor «Aleksandr Soljenítsin (1918-2008) combateu na Segunda Guerra Mundial e esteve preso e internado em campos de trabalho forçado de 1945 a 1953, após críticas privadas a Estaline. Ilibado na sequência da «abertura» criada pelo famoso discurso de Krutchev denunciando os crimes estalinistas, foi professor e iniciou o seu percurso de escritor nos anos 50. Um dia na vida de Ivan Deníssovitch, classificado por Aleksandr Tvardovski, seu editor na revista Novy Mir, em 1962, como um «clássico», teve a sua publicação expressamente autorizada por Krutchev e foi estudado nas escolas. Mas a vida de escritor de Soljenítsin viria a ser atribulada e reprimida na sequência da recusa pela União dos Escritores da publicação de Pavilhão de cancerosos e da atribuição do Prémio Nobel da Literatura em 1970. Foi expulso da União Soviética em 1974, vivendo na Suíça, em França e nos Estados Unidos até à queda do Muro de Berlim, após o que regressou a Moscovo, em 1994, sendo recebido triunfalmente. As suas obras marcaram indelevelmente a literatura russa do século XX, inserindo-se na grande tradição narrativa de nomes como Tchekov, Tolstoi e Dostoievski.»
Segundo informa a Sextante, na sua nota de imprensa, este «é um livro de condenação da existência dos campos de trabalho forçado e extermínio da União Soviética», «uma obra emblemática de combate ao totalitarismo de face estalinista, acerca da dura vida nos campos de extermínio e trabalhos forçados soviéticos. Escrito clandestinamente de 1958 a 1967, o manuscrito de O arquipélago Gulag acabou por ser descoberto pelo KGB em 1973. Na sequência disso, Soljenítsin, que entretanto havia sido galardoado com o Prémio Nobel da Literatura, decide publicar o livro no estrangeiro. Uma primeira edição em russo é publicada em Paris ainda em 1973, sendo no ano seguinte lançada uma edição em francês. Soljenítsin é entretanto preso, acusado de traição, despojado da nacionalidade soviética e enviado para o exílio, onde estará vinte anos, até ao seu regresso à Rússia, em 1994. Para realizar este extraordinário livro, Soljenítsin foi ajudado pelo testemunho de 227 sobreviventes dos campos do Gulag, tendo ele próprio estado no de Ekibastuz, no Cazaquistão (campo descrito no romance Um dia na vida de Ivan Deníssovitch – Sextante Editora, 2012). O livro agora publicado pela Sextante é a versão abreviada, num só volume, preparada por Soljenítsin e por sua mulher, Natália – que, de resto, assina o prefácio –, com o objetivo de se tornar mais acessível aos leitores estrangeiros e a novos leitores que, como ele, deverão «condenar publicamente a ideia de que homens possam exercer tal violência sobre outros homens. Calando o mal, fechando-o dentro do nosso corpo para que não saia para o exterior, afinal semeamo-lo».
Sobre o autor «Aleksandr Soljenítsin (1918-2008) combateu na Segunda Guerra Mundial e esteve preso e internado em campos de trabalho forçado de 1945 a 1953, após críticas privadas a Estaline. Ilibado na sequência da «abertura» criada pelo famoso discurso de Krutchev denunciando os crimes estalinistas, foi professor e iniciou o seu percurso de escritor nos anos 50. Um dia na vida de Ivan Deníssovitch, classificado por Aleksandr Tvardovski, seu editor na revista Novy Mir, em 1962, como um «clássico», teve a sua publicação expressamente autorizada por Krutchev e foi estudado nas escolas. Mas a vida de escritor de Soljenítsin viria a ser atribulada e reprimida na sequência da recusa pela União dos Escritores da publicação de Pavilhão de cancerosos e da atribuição do Prémio Nobel da Literatura em 1970. Foi expulso da União Soviética em 1974, vivendo na Suíça, em França e nos Estados Unidos até à queda do Muro de Berlim, após o que regressou a Moscovo, em 1994, sendo recebido triunfalmente. As suas obras marcaram indelevelmente a literatura russa do século XX, inserindo-se na grande tradição narrativa de nomes como Tchekov, Tolstoi e Dostoievski.»
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