Walter Benjamin: Melancolia e Revolução, ensaio publicado pela Editora Exclamação, recentemente distinguido com o Prémio PEN Ensaio 2020 (ex-aequo com João Barrento), resulta da tese de doutoramento de Maria João Cantinho, onde a autora torna claro, numa linguagem límpida e em subtil crescendo – não isenta da «perplexidade» que por vezes o pensamento de Walter Benjamin lhe provoca –, o percurso das «ideias iniciais que constituem o fermento messiânico do pensamento benjaminiano» que conhecem um inopinado desenvolvimento através do contacto com as leituras do materialismo dialéctico e que conduzem ao seu «pessimismo», que «consiste num olhar advertido contra todos os “falsos optimismos” da história (…) que se inspiram na ilusão do progresso».
«Visionário, o jovem Benjamin esteve sempre na dianteira da sua época, diagnosticando o mal-estar generalizado que crescia lentamente e se insinuava no coração de uma Europa atingida pela catástrofe» (p. 91)
As teses do pensamento benjaminiano, como a autora demonstra logo a partir das suas obras iniciais, são desenvolvidas num contexto político e social onde já se pressente o terror que se avizinha, com a chegada da II Guerra Mundial (que empurra este intelectual na direcção de Portugal em fuga ao nazismo) pelo que este pensamento messiânico é também uma última esperança no futuro da Humanidade, ou um «último gesto que nos salve ainda da catástrofe» (p. 225), a começar pelos estudos em que procura definir uma teoria da linguagem «cuja essência proporcione o ponto de abertura para uma experiência superior, messiânica» (p. 221). O conceito de messianismo não remete, ressalve-se, para a figura de um Messias-Salvador, mas sobretudo de um tempo (não o fim dos tempos, mas o tempo do fim), que respeita ao «acontecimento histórico» e à «interrupção».
A filosofia de Walter Benjamim, como a autora lembra bem, é ainda hoje «um quadro teórico incontornável» (p. 24), inclusivamente nas artes como fotografia e cinema, âmbito aliás em que é mais abordada nas faculdades portuguesas.
Apresentei aqui, no ano passado, uma recensão sobre o romance biográfico A Travessia de Benjamin, de Jay Parini, publicada pela Elsinore, que narra os últimos dias da vida deste alemão de origem judaica, que se fazia acompanhar de uma mala onde transporta a sua obra, um manuscrito com cerca de 100 páginas e outros textos. Ver artigo
Jay Parini é poeta, romancista biográfico e autor de biografias de autores de relevo, como John Steinbeck, Robert Frost e William Faulkner. A sua obra A Última Estação retrata os últimos dias de Tolstoi, e foi adaptada ao cinema. A Travessia de Benjamin de Jay Parini, obra publicada pela Elsinore, segue o mesmo modelo dessa obra (e de outra ainda não publicada entre nós sobre Herman Melville), mas agora com maior profundidade, ao narrar os últimos meses da vida de Walter Benjamin, quando em 1940 este alemão de origem judaica, que se faz acompanhar constantemente de uma mala onde transporta a sua obra de uma vida, um manuscrito com cerca de 100 páginas e outros textos, se vê enclausurado com a sua irmã numa Paris cercada pelos nazis.
Neste romance biográfico, vamos seguindo o percurso de Walter Benjamin, um homem com os seus cinquenta anos, desfasado da realidade, desde os dias que passa numa biblioteca, onde fica conhecido como «o homem que se senta na Bibliothèque Nationale e nada produz» (p. 204), passando por um período em que esteve detido num centro de recolha (quase como um campo de concentração) onde é instado a dar prelecções como forma de ocupar o tempo e as mentes de uma série de refugiados, também eles intelectuais, até ao dia que é atirado, com a sua omnipresente pasta e manuscrito, borda fora de um barco onde tentava fugir, para por fim tentar uma travessia por terras de Espanha que o levem até Portugal.
«Atravessaríamos Espanha e entraríamos em Portugal, que era considerado um local mais adequado do que Marrocos para esperar pelo fim da guerra. Portugal manter-se-ia, certamente, uma zona neutra, e o nível de vida lá era razoavelmente elevado.» (p. 197)
A personagem de Walter Benjamin, uma das mentes mais brilhantes de uma geração de intelectuais e de um círculo de figuras com que conviveu, como Bertolt Brecht ou a sua prima Hannah Arendt, é sabiamente refractada através da perspectiva de outros que com ele conviveram, e poucas vezes a uma luz abonatória: «Ouvir um homem como aquele punha à prova a paciência de uma pessoa. Tudo lhe fazia recordar um livro, uma personagem de um livro ou o autor de um livro. No seu leito de morte, haveria de gritar: «Lembro-me de uma cena num livro onde acontece assim!» Só com a sua morte cessariam as referências, provavelmente tanto para ele como para toda a gente.» (p. 213)
O autor recorre ainda a fragmentos escritos da obra de Walter Benjamin no início de cada capítulo, traduzidos por si mesmo, e na própria narrativa não se inibe em, por vezes, levar-nos em dissertações filosóficas que equivalem a entrar na cabeça do nosso protagonista. Os eventos, locais e datas são fiéis à realidade, e o autor baseou-se ainda em cartas bem como testemunhos escritos e escutados de quem conviveu com Benjamin, figuras essas também convertidas nesta obra em personagens. Ver artigo
Pesquisar:
Subscrição
Artigos recentes
Categorias
- Álbum fotográfico
- Álbum ilustrado
- Banda Desenhada
- Biografia
- Ciência
- Cinema
- Contos
- Crítica
- Desenvolvimento Pessoal
- Ensaio
- Espiritualidade
- Fantasia
- História
- Leitura
- Literatura de Viagens
- Literatura Estrangeira
- Literatura Infantil
- Literatura Juvenil
- Literatura Lusófona
- Literatura Portuguesa
- Música
- Não ficção
- Nobel
- Policial
- Pulitzer
- Queer
- Revista
- Romance histórico
- Sem categoria
- Séries
- Thriller
Arquivo
- Novembro 2024
- Outubro 2024
- Setembro 2024
- Agosto 2024
- Julho 2024
- Junho 2024
- Maio 2024
- Abril 2024
- Março 2024
- Fevereiro 2024
- Janeiro 2024
- Dezembro 2023
- Novembro 2023
- Outubro 2023
- Setembro 2023
- Agosto 2023
- Julho 2023
- Junho 2023
- Maio 2023
- Abril 2023
- Março 2023
- Fevereiro 2023
- Janeiro 2023
- Dezembro 2022
- Novembro 2022
- Outubro 2022
- Setembro 2022
- Agosto 2022
- Julho 2022
- Junho 2022
- Maio 2022
- Abril 2022
- Março 2022
- Fevereiro 2022
- Janeiro 2022
- Dezembro 2021
- Novembro 2021
- Outubro 2021
- Setembro 2021
- Agosto 2021
- Julho 2021
- Junho 2021
- Maio 2021
- Abril 2021
- Março 2021
- Fevereiro 2021
- Janeiro 2021
- Dezembro 2020
- Novembro 2020
- Outubro 2020
- Setembro 2020
- Agosto 2020
- Julho 2020
- Junho 2020
- Maio 2020
- Abril 2020
- Março 2020
- Fevereiro 2020
- Janeiro 2020
- Dezembro 2019
- Novembro 2019
- Outubro 2019
- Setembro 2019
- Agosto 2019
- Julho 2019
- Junho 2019
- Maio 2019
- Abril 2019
- Março 2019
- Fevereiro 2019
- Janeiro 2019
- Dezembro 2018
- Novembro 2018
- Outubro 2018
- Setembro 2018
- Agosto 2018
- Julho 2018
- Junho 2018
- Maio 2018
- Abril 2018
- Março 2018
- Fevereiro 2018
- Janeiro 2018
- Dezembro 2017
- Novembro 2017
- Outubro 2017
- Setembro 2017
- Agosto 2017
- Julho 2017
- Junho 2017
- Maio 2017
- Abril 2017
- Março 2017
- Fevereiro 2017
- Janeiro 2017
- Dezembro 2016
- Novembro 2016
- Outubro 2016