O Simpatizante, de Viet Thanh Nguyen, publicado pela Elsinore em 2017, com tradução de Maria do Carmo Figueira, não sendo novidade nem por isso desmerece atenção – e estava há muito na lista, até que finalmente o agarrei, agora que estreia, justamente hoje, a minissérie (de sete episódios), mais uma das grandes apostas da HBO Max. Nos principais papéis contamos com Hoa Xuande, Sandra Oh e Robert Downey Jr. (que se desdobra em várias personagens secundárias).

O Simpatizante, romance de estreia do autor, foi vencedor do Prémio Pulitzer para Ficção 2016, assim como de outros galardões, como o Dayton Literary Peace Prize, o Edgar Award para Melhor Primeiro Romance, a Medalha Andrew Carnegie de Excelência na Ficção ou o Asian/Pacific American Literature Award. Foi considerado Melhor Livro de 2015 pelo New York Times Book Review, Wall Street Journal e Washington Post.

Um romance de espionagem e sobretudo uma negra sátira, numa prosa torrentosa, irónica, mordaz, à Guerra do Vietname, uma “república das jacas” que funcionava como concessionária dos Estados Unidos até ao momento em que se fartaram e os traíram.

A narrativa começa justamente no mês de abril. O ano é 1975. O narrador na primeira pessoa, autor desta confissão, que toma por narratário um Comandante, começa por descrever uma Saigão mergulhada no caos. Um general do exército do Vietname do Sul bebe whisky e delega no seu capitão de confiança a tarefa de fazer uma lista com os nomes dos passageiros com permissão para apanhar os últimos voos de saída do país.

Este capitão é um “homem de duas faces”: um espião, portanto. Mas é também, ironicamente, como descobriremos no final do primeiro capítulo, um homem dividido em dois – como o seu próprio país. Um bastardo. Um eurasiático. Criado por uma mãe vietnamita pobre, filho de um pai francês incógnito que, à semelhança de outros colonizadores e ocupantes, como os ingleses na Índia, não resistiu a provar o chocolate negro. O Simpatizante é, ainda, um homem que a certa altura foi enviado para a universidade nos E.U.A. Metade aluno bolseiro, metade espião em formação, viveu 6 anos durante a década de 60 no “mundo etéreo e ébrio de sol do Sul da Califórnia”. Aí leu história e literatura norte-americana, aperfeiçoou a gramática, ganhou um sotaque irrepreensível que desconcertava quem o conhecia, absorveu o calão, ganhou um vocabulário lato (superior ao de um norte-americano com uma educação média), fumou erva, perdeu a virgindade. Para depois regressar ao Vietname e lutar pela causa comunista, tornando-se no ajudante de campo e oficial mais versado na cultura norte-americana.

Viet Thanh Nguyen é professor de Estudos Americanos e Etnicidade e professor catedrático de Inglês na University of Southern California, nos E.U.A. Do mesmo autor, a Elsinore publicou Refugiados e O Comprometido.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.