Bruno Vieira Amaral estudou História Contemporânea, é crítico literário, ensaísta, vencedor do Prémio José Saramago, entre outros, com o seu primeiro romance, As Primeiras Coisas (2013), e foi nomeado em 2016 como Uma das Dez Novas Vozes da Europa.
Embora o mote do romance seja apurar a verdade por trás do assassínio do primo João Jorge, morto no bairro em que ambos viviam na década de 80, essa sua investigação rapidamente se impõe como «estratégia de recuperação e construção da sua própria memória». Alerta o narrador logo na primeira frase do romance, «Para mim, João Jorge nasceu na noite em que o mataram», para a génese de uma personagem e de uma obra criadas em torno do que sobeja do real.
Ao jeito de O Delfim, em parte romance policial, com recurso às mais diversas fontes – testemunhos, arquivos judiciais, notícias da época –, em parte teoria da escrita do próprio romance, com constantes citações e referências literárias – o próprio título da obra é uma citação bíblica –, Hoje estarás comigo no Paraíso é um magnífico exercício de reescrita do passado, onde o autor põe a nu (ou assim o faz entender) o seu método de pesquisa ou a forma como conduziu a investigação, se convoca para o texto, pois o narrador é claramente associado ao próprio autor, e conforme nos narra episódios da sua infância e juventude, evocados por associação directa no decurso da sua procura pela verdade, traça ainda uma história da sua família, da vida num bairro da margem sul, e da Angola antes da independência, sem qualquer pudor em apresentar um mundo inteiramente marginal, logo ali ao lado da metrópole, como alguns autores brasileiros tantas vezes procuram fazer, de modo a retratar uma realidade crua, violenta, visceral, que está para além da fantasia telenovelística.
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