Grand Hotel Europa, de Ilja Leonard Pfeijffer, é o belíssimo título inaugural da coleção Contemporânea, chancela Livros do Brasil, e o primeiro romance do autor publicado entre nós, traduzido do neerlandês por Maria Leonor Raven.

Já com várias obras premiadas internacionalmente, Grand Hotel Europa,com mais de 300 mil exemplares vendidos, arrebatou a crítica e os leitores holandeses. Não se pense contudo que é um livro ligeiro, ou que as suas quase 600 páginas se lêem com a superficialidade de um best-seller. Grand Hotel Europa é um romance reflexivo, de várias camadas e feito de histórias interligadas, sobre a identidade europeia na desafiante era do turismo de massas, mas também uma sátira genuinamente divertida.

Um escritor, que partilha o nome do autor, aloja-se no ilustre e decadente Grand Hotel Europa com o fito de reconstruir pela escrita os destroços da sua relação com Clio, uma fogosa italiana com quem vive uma esplendorosa história de amor em Veneza, uma cruzada (ao estilo de Dan Brown) em busca de uma pintura de Caravaggio, tórridas cenas de sexo e explosivas crises de ciúmes. O romance alterna magistralmente entre dois planos: o passado vivido com Clio, que partilha o nome da musa da História, e era ela própria historiadora de arte; e o presente no Grand Hotel Europa, que entretanto é apropriado por um chinês, e começa rapidamente a perder a sua identidade genuinamente europeia, até para melhor servir as hordas de turistas chineses. Conduzindo-nos entre tempos distintos, e locais diversos, o narrador interpela directamente o leitor, e expõe, muitas vezes mediante diálogos, uma pertinente reflexão, bastante informada. A narrativa perspectiva a Europa como um continente velho e cansado, que apenas tem o passado como oferta, cuja história não pode ser realmente degustada pelos visitantes que estão muito mais preocupados em fazer maratonas turísticas, mas sempre sem que se perceba realmente que são turistas, para poder tornar a sua linha do tempo nas redes sociais mais apelativa – pois “o mais baixo que se pode hoje descer na condição humana é não viajar regularmente”. Mas há também o reverso da moeda: o modo como a Europa se tem redefinido, muitas vezes com o risco de negar a sua própria autenticidade, colocando assim a sua sobrevivência em risco face à necessidade de se reinventar para chamar turistas.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.