A ingressar num género que leio muito pouco, o policial, este livro, de peso, promete ainda assim ser uma leitura leve e ágil, pois os capítulos são curtos e a intriga é veloz, em capítulos que se sucedem inclusivamente numa contagem decrescente, a começar 33 dias antes da estreia do 21.º festival de teatro da (outrora) pacata cidade de Orphea.
Jesse Rosenberg é um ainda jovem capitão, com apenas 45 anos mas a poucos dias de se reformar com uma taxa de 100% de sucesso, quando é confrontado pela jornalista Stephanie Mailer de que um dos seus primeiros casos foi mal resolvido…
Fico sempre com a sensação que estou a ler um mero argumento de filme – o que retira grande prazer da leitura, apenas contrabalançado pelo ritmo frenético em que a escrita nos leva.
Joël Dicker, publicado pela Alfaguara, tornou-se um fenómeno literário global de sucesso de vendas com A verdade sobre o caso Harry Quebert (2013). Este é o seu quarto romance e tem criado grande burburinho (em Barcelona lembro-me que invadiu todos os escaparates). Ver artigo
Nascido em Nápoles, em 1943, foi professor e escreveu para um suplemento cultural, autor de vários romances e contos, alguns adaptados a filmes e séries televisivas. Laços foi distinguido como melhor livro do ano por vários jornais internacionais (The New York Times, Kirkus Reviews, The Sunday Times) e venceu o Prémio Bridge de melhor romance.
São 141 páginas, numa história repartida em três partes, ou livros. No primeiro livro, que parece constituir um breve prólogo, é a mulher abandonada e traída que se lamenta e apela ao marido uma explicação. É no fundo o discurso na primeira pessoa que compôs diversas cartas escritas ao marido, e às quais percebemos que ele foi respondendo. No segundo livro, curiosamente bastante mais extenso, é o marido que discorre sobre aquilo que foi para ele o casamento e como deu por si a “estar com outra mulher” ainda antes de “se apaixonar” por essa mulher, num tempo (quarenta anos antes) em que o divórcio era ainda inconcebível, apesar do adultério e de os homens deixarem mesmo a sua mulher e filhos para começar de novo com outra. No terceiro livro, fala-nos um dos filhos deste casal.
Aldo, agora um «senhor falsamente distraído de setenta e quatro anos», casado com Vanda «uma senhora falsamente enérgica de setenta e seis anos», regressam de férias a uma casa que foi vandalizada, apesar de nada existir para roubar (uma metáfora de um casamento vazio onde tudo foi destruído). Ao arrumar os destroços espalhados pela casa, Aldo dá por si a relembrar o que aconteceu no seu casamento, que dura há cinquenta e dois anos, «um longo fio de tempo encolhido», e relembra o tempo em que era um «assistente sem futuro de Gramática Grega» e se apaixona por Lidia, uma estudante de Economia (p. 32).
Este livro, publicado pela Alfaguara, reflecte sobre os frágeis laços de família e heranças que se transmitem ou inventam, como forma de confortar e aproximar entes tão distintos, mesmo quando partilham o mesmo sangue. Um retrato sublime de uma história banalizada, quando um homem sai de casa para se juntar com uma mulher, ao mesmo tempo que traça uma história do casamento e do adultério ao longo das últimas décadas, e do que se tornou comum ou aceitável, mesmo quando contra a norma: «Estar casado, ter família própria numa idade novíssima, tornara-se um sinal não de autonomia, mas de atraso. Com menos de trinta anos, sentia-me velho, e parte – à minha revelia – de um mundo, de um estilo que, no ambiente político e cultural a que aderia, era considerado iminentemente acabado. Pelo que, embora tivesse uma relação forte com a minha mulher e as duas crianças, depressa me deixei fascinar por modos de vida que programaticamente suprimiam todos os vínculos tradicionais.» (p. 63) Ver artigo
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