Histórias breves, por vezes retratos exemplares da vida moderna, outras remontando a décadas prévias, como Adélia que ainda recorda «o barulho que faziam os cascos dos bois a bater no empedrado» ao puxarem os carros de fruta e legumes que abasteciam a cidade, ou o apaixonado pela encantadora de serpentes nos anos do pós-guerra.
Alguns destes contos, uns fugazes, outros mais novelescos, parecem constituir instantâneos captados aqui e ali, e rapidamente esboçados como rascunhos do quotidiano de personagens que se desencontram pela vida. Algumas das narrativas são inclusivamente indicadas na contra-capa do livro como resultado das vivências da autora, como é o caso de «A Mãe da Plaza de Mayo». Perpassa na grande maioria destes dezanove contos um certo desencanto perante a vida, ainda que visto com subtil ironia e humor. Humor esse quase sempre crítico como quando se fala do homem que morreu «levando a mulher alguns meses depois, não fosse ele precisar de alguma coisa e não a ter por perto» (pág. 28).
Humor inclusivamente negro, como no conto «Seguro de Vida», se bem que nunca sabemos se é um humor realmente negro, ou se é apenas a inconveniência de algumas pessoas que não sabem medir aquilo que dizem.
No primeiro conto da colectânea, «Carta a Matilde», o leitor depara-se com uma ambiência fantástica de natureza mais soturna, quando um cleptómano rouba a voz a um cantor.
«O Bígamo» é um dos contos mais bem conseguidos, livremente inspirado numa situação real em que duas mulheres muito parecidas esperavam um homem no consultório.
Instantâneos breves, ocasionalmente fugazes, de pessoas muitas vezes sozinhas e perdidas, em lugares tão díspares como Buenos Aires ou Paris.
A autora nasceu em Buenos Aires, em 28 de Fevereiro de 1948, estudou História e Belas Artes, e a sua obra que varia entre o romance, o conto e a poesia está publicada em Portugal, no Brasil, no Chile e em Espanha. Ver artigo
O cientista e escritor António Damásio recebeu no passado dia 20 de março o Prémio de Vida e Obra na Gala da Sociedade Portuguesa de Autores (SPA). A cerimónia decorreu no Centro Cultural de Belém e será transmitida em direto pela RTP.
O seu mais recente livro, publicado o ano passado, é A Estranha Ordem das Coisas: A Vida, os Sentimentos e as Culturas Humanas.
O autor aborda as emoções, os afectos humanos, os sentimentos (que defende como uma combinação única de corpo e cérebro) como propulsores da actividade cultural. Numa escrita acessível e ligeira, com espaço para o humor, o autor tenta perceber como é que a vida humana está ligada hoje ao que era no seu início, há 3,8 mil milhões de anos, procurando explicar como é que os sentimentos estão na base da cultura produzida pelo homem tanto então como agora. O autor considera ainda como apesar de até as culturas de bactérias se poderem comportar como comunidades humanas, na forma como se agrupam para sobreviver, o condão da criatividade humana cabe exclusivamente ao homem, pois esta capacidade «assenta na vida e no facto extraordinário de que a vida vem equipada com uma ordem precisa: resistir e projectar-se para o futuro, aconteça o que acontecer.» (pág. 50)
Autor conhecido internacionalmente, tem publicado a sua investigação lá fora, antes de ser traduzido para Portugal, e as suas ideias estão descritas em diversos livros, como O Erro de Descartes: Emoção, Razão e Cérebro Humano (1995), O Sentimento de Si: O Corpo, a Emoção e a Neurobiologia da Consciência (2000), Ao Encontro de Espinosa: As Emoções Sociais e a Neurologia do Sentir (2003); O Livro da Consciência: A Construção do Cérebro Consciente (2010) e o mais recente A Estranha Ordem das Coisas: A Vida, os Sentimentos e as Culturas Humanas, publicado o ano passado.
Os seus livros são publicados em Portugal pela Temas e Debates, estão traduzidos em mais de trinta línguas e estudados em universidades do mundo inteiro.
Destaque-se ainda, em jeito de conclusão, a luminosa frase: «As ciências, por si só, não podem iluminar a experiência humana sem a luz que provém das artes e das humanidades.» (p. 17) Ver artigo
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