Colson Whitehead venceu o Prémio Pulitzer e o National Book Award com A estrada subterrânea, e num feito incomum na história da literatura americana venceu novamente o Pulitzer com o romance Os rapazes de Nickel, agora traduzido por Hugo Gonçalves e publicado pela Alfaguara.
O autor traça um retrato da América do séc. XIX, em A estrada subterrânea (2017), em que a história individual de Cora representa a condição do escravo e da luta pela liberdade e dignidade humanas. Uma narrativa baseada em factos reais que era uma resposta necessária aos tempos incertos que ainda se vivem na América e no mundo. Os rapazes de Nickel é, uma vez mais, uma narrativa sobre o racismo, igualmente baseada num caso real – um reformatório da Flórida que destruiu a vida de milhares de jovens.
Elwood Curtis, deixado pelos pais aos 6 anos, é criado por Harriet, uma avó extremamente protectora, que amaldiçoa o dia em que comprou um disco com discursos de Martin Luther King pois nele havia demasiadas ideias e o que esta avó, que tem o medo como combustível, menos quer é que o seu neto, um rapaz negro a viver no Sul dos Estados Unidos, na década de 60, conheça o destino que parece irremediavelmente fadado a atingir a sua família (e todos os negros): o pai de Harriet morreu na cadeia, injustamente acusado por uma branca; o marido de Harriet é encontrado enforcado na cela onde aguardava audiência, tendo sido preso por tentar defender um empregado negro numa escaramuça provocada por brancos.
Elwood Curtis demarca-se dos demais jovens de Tallahassee que se metem permanentemente em sarilhos: é educado, trabalhador, lê como quem recita. E num sítio onde são inclusivamente poucos os rapazes brancos que pensam ir para a universidade, Elwood tem a oportunidade de frequentar um curso especial para os melhores alunos de liceu – como prenúncio de um promissor futuro numa universidade. Não fosse um golpe do destino – que atinge o leitor como um murro no estômago – tolher-lhe todos os planos e conduzi-lo para o reformatório Nickel, uma instituição que à primeira vista parece a escola perfeita:
«Nickel não devia ser assim tão má. Esperava muros de pedra, bem altos, e arame farpado, mas não havia muros. O campus estava meticulosamente cuidado, uma fartura exuberante de verde e edifícios de tijolo vermelho, com dois e três andares. Os cedros e as faias, altos e antigos, desenhavam sombras. Era a propriedade mais bonita que Elwood alguma vez vira – uma escola a sério, e boa, não o reformatório ameaçador que ele imaginara nas últimas semanas.» (p. 57)
Mas mais uma vez a ingenuidade desarmante e a bondade intrínseca de Elwood será posta à prova e rapidamente descobre que aquela fachada esconde uma câmara de horrores.
Colson Whitehead, nascido em 1969 em Nova Iorque, tem leccionado em instituições como a Universidade de Columbia e Princeton e foi distinguido com as bolsas Guggenheim e MacArthur. Segundo o júri do Pulitzer, este livro é uma «poderosa história sobre a perseverança, dignidade e redenção», «uma exploração avassaladora e devastadora dos abusos».
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