O Mapeador de Ausências é o mais recente romance de Mia Couto, publicado no final de 2020 pela Caminho.

Depois de uma trilogia, o autor presenteia-nos com mais um romance de grande fôlego cuja acção decorre no Moçambique pré e pós-independência, alternando entre 1973, vésperas da Revolução do 25 de Abril que marca o final da guerra colonial e a independência das províncias do ultra-mar, e entre março de 2019, nas vésperas do ciclone Idai que devastou a cidade da Beira – já sei que estou sempre a regressar a este assunto, mas desta vez é o autor que o puxa e não eu.

Diogo Santiago é um prestigiado e respeitado intelectual moçambicano, professor universitário em Maputo e aclamado poeta, reconhecido por todos, com quem se demora para alguns dedos de conversa, regressa depois de uma ausência de muitos anos à sua terra natal, a cidade da Beira, para receber uma homenagem.

O regresso à Beira, dias antes de um apocalipse anunciado, é também o retorno ao seu passado, à história da sua família, quando Diogo Santiago era um menino branco, filho de um pai mais poeta do que jornalista (cujas melhores reportagens foram ficcionadas) e ao tempo em que Moçambique era ainda uma colónia portuguesa e os próprios portugueses brancos se começam a revoltar contra os militares por uma guerra que é uma não-guerra.

Mia Couto parece tomar Diogo Santiago como um alter-ego, jogando com a personagem como duplo ou sombra, ao mesmo tempo que faz uma crítica subtil ao actual Moçambique, descrevendo a realidade de forma fidedigna (para quem viveu ou conhece pela Beira reconhece muitos dos locais, das idiossincrasias, dos costumes), conforme entretece histórias dispersas que formam um mosaico de um país entre o mito e a ruína.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.