Guylain Vignolles tem 36 anos, é solteiro, e tem por única companhia uma série de peixes dourados, que se sucedem uns aos outros, e um velho que foi seu colega e mentor, até que as suas pernas foram amputadas na fábrica onde trabalham. Guylain Vignolles tem por fardo um nome cujo infeliz trocadilho significa algo como «fantoche feio», o que parece condizer com a sua profissão infeliz, que lhe cria repulsa, e que consiste em alimentar uma máquina, a que chama a Coisa. A função da Coisa é triturar, retalhar, rasgar, esmagar, esborrachar, até regurgitar uma massa cinzenta. Guylain Vignolles é um cidadão anódino, um funcionário discreto como uma sombra, não fosse naqueles breves momentos em que na viagem do comboio das 6h27 para Paris, a caminho do trabalho, lê em voz alta para os passageiros do comboio, que anseiam aquele instante, trechos soltos, fragmentos de páginas que sobrevivem a essa máquina devoradora de livros. Até que um dia a leitura de páginas soltas de livros que resgata ao ventre da Coisa é substituída pela leitura de 72 ficheiros de texto, guardados numa pen drive que encontra por acidente no assento do comboio, e que são nada menos do que entradas do diário de uma empregada de limpeza das casas de banho de um centro comercial.
Este pequeno livro, cheio de humor e poesia, é rico em personagens singulares, como o velho que procura reconstituir as suas pernas através da demanda dos 1300 exemplares de Jardins e Hortas de outrora, editados numa pasta de papel única; o guarda de fábrica que fala em versos alexandrinos; os idosos no lar que vibram a cada nova leitura e dão largas à imaginação para construir um contexto que envolva o pouco que a leitura revela; ou a jovem empregada de limpeza que escreve disfarçadamente nas pausas do seu trabalho, pois é sobejamente conhecido que é no mínimo desconcertante descobrir que alguém que se dedica a esfregar sanitas e os 14 717 azulejos que a rodeiam é também uma mulher letrada.
Este romance, publicado pelo Clube do Autor, foi considerado um fenómeno literário em França, foi vencedor de vários prémios, traduzido para 30 países e será adaptado ao cinema.
Uma óptima companhia para uma tarde de praia.
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