Este é o último romance da autora publicado agora em Setembro, penso que já está à venda, pois recebi-o um pouco antes do lançamento.
É a segunda obra – exceptuando alguns contos de E se eu morrer antes de acordar – que leio da autora e continuo intrigado. Tenho li no grupo opiniões diversas mas, como é natural, só posso saber depois de provar, e não fiquei desiludido.
Mantém-se o tom de mistério, em que se desvelam factos aqui para camuflar outros ali, num certo jogo de luz e sombra, em que o cinema está sempre muito presente. Exceptuando aquilo que sabemos através das personagens, quase poderíamos estar a seguir tudo num ecrã. O livro abre justamente com a referência à cena de um filme: La Notti Bianche.
Uma jovem acorda num quarto estranho, mas vagamente familiar, e enquanto permanece mergulhada numa espécie de limbo vai absorvendo aquilo que os que a rodeiam, e que a tratam sempre como alguém que conhecem, que faz parte da casa, da sua “família, como forma de ganhar tempo e de ir recolectando os fragmentos de memória que lhe vão chegando. Assim nunca sabemos se Karen, nome pelo qual a chamam, sofre de alguma forma de amnésia, em virtude de um acidente ocorrido previamente, ou se simplesmente vive um sonho em que a sua vida parece ter-se tornado na vida de outra pessoa.
Enquanto Karen tenta integrar-se mais na pele dessa mulher que parece ter vestido ao acordar numa certa manhã, é peculiar a forma como Emily a trata, por vezes referindo-se a si na segunda pessoa, outras na terceira pessoa, mantendo a ambiguidade da sua identidade: «A Karen gosta de observar a cascata o ano inteiro.» (pág. 56).
Esta é outra das narrativas intrigantes da autora, com o seu universo muito próprio, mas gostei particularmente da forma como a memória de Karen (?) reside essencialmente nas mais pequenas coisas, como um cheiro, o toque, o nervoso de desejar pintar, mesmo que não reconheça de todo as pessoas com quem habita o quotidiano ou se lembre do que é, de facto, a sua vida.
Gradualmente, já não sabemos se ela é ou não Karen, se ela quer ou não perceber qual a sua verdadeira identidade: «Eu sabia isso a seu respeito. Sabia muitas coisas a seu respeito de que ninguém me tinha falado. Não era possível ter o mesmo rosto e o mesmo corpo e não partilhar um pouco a alma.» (pág. 86).
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