Não sei explicar porque levei anos até finalmente ler História do Novo Nome, volume 2 da tetralogia napolitana de Elena Ferrante, autora publicada pela Relógio d’Água, com tradução de Margarida Periquito. Comprei os livros assim que a febre Ferrante (há até um documentário com este nome, como devem saber) começou a deflagrar mas emprestei-os a um amigo que os devorou primeiro até que me dignasse a ler o primeiro. Gostei, mas não fiquei agarrado como esperava. Entretanto quase 4 anos depois, em que mudei de país duas vezes, saiu a série (cada temporada tem 8 episódios), vi a primeira temporada, ouço a banda sonora do meu caro Max Richter, li há meses A Vida Mentirosa dos Adultos, e anos depois, com 2 países pelo meio, termino finalmente a leitura deste volume, ao mesmo tempo que fui intercalando com o visionamento da segunda temporada desta série da HBO – cada temporada corresponde a cada um dos livros da tetralogia.

O título do livro deve-se ao novo nome tomado por Lila, e à nova identidade que de alguma forma adopta, agora como mulher casada, enquanto que Elena se sente inferior, amputada, ao sentir que perdeu a amiga que transpôs o limiar de uma vida nova onde ela não tem lugar, e desamparada, sem saber que caminho seguir, chegando ao ponto de descurar os estudos – a sua oportunidade (sempre presente esta dicotomia) entre o bairro e uma vida fora do bairro que só será possível com os estudos. Confesso que fui ficando mais preso ao livro na segunda metade da metade da narrativa, conforme nos enredamos na relação amor-ódio de Lila e Elena, nomeadamente devido a um complexo de inferioridade de Elena em relação à (outra) amiga genial. Porque, por enquanto, enquanto me preparo para mergulhar nos próximos dois volumes, continuo sem saber qual delas será verdadeiramente a amiga genial, mas inclino-me ainda assim a pensar que será Elena. E sempre com um prazer adicional (que alguns anos de leitura crítica já deveriam ter suprimido) de pensar que esta história é a verdadeira revelação, afinal, da vida da autora que se esconde nestas figuras de papel. Como aliás se pode ler – quando ela inesperadamente descobre que querem publicar o seu livro, a partir de um manuscrito que não fora escrito com essa intenção – quando dizem a Elena para não alterar uma vírgula no seu texto, pois nele há “sinceridade, naturalidade, e um mistério da escrita que só os livros verdadeiros têm” (p. 355).

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.