Os Memoráveis, romance de Lídia Jorge (publicado em 2014 pela Dom Quixote) que constitui «Uma revisitação literária aos mitos fundadores da Revolução e da Democracia» passa a fazer parte da Colecção Essencial – Livros RTP, um projeto cultural concebido pela RTP em parceria com a LeYa, sob curadoria do editor Zeferino Coelho.
Ao ler Os Memoráveis prevalece a agradável sensação de um quase retorno ao “extra-ordinário” dos primeiros dois romances da autora, com uma aura fantástica, ou melhor, de realismo mágico. Em 2014, a autora concedeu uma entrevista ao Cultura.Sul e relembramos agora algumas das suas próprias palavras para chegarmos «ao coração do coração da fábula».
Quando em 2000 o suplemento literário do jornal Público, então designado «Leituras», solicitou
A situação que inspirou este romance foi, em parte, a forma como cinco jovens escritores portugueses, com menos de trinta e cinco anos, que escreveram textos tendo por mote a revolução, acabaram todos por evitar o assunto, pois a revolução de 1974 parecia ser-lhes alheia.
A autora declara ter havido um processo de pesquisa, embora não sistemático, acumulando ao longo dos anos vários dados, como livros, artigos, documentários, entrevistas. Fez inclusive várias entrevistas e o contacto com determinadas figuras confirmava a sua ideia: «Era preciso escrever sobre o “Olhar de Ulisses” português.»
Este romance não se pode definir como um romance historiográfico, pois o que interessava à autora era escrever «sobre o momento da História em que os dados reais se transfiguram em lenda. Trata-se de um livro sobre uma mitologia. Escrevi sobre factos irreais para tentar atingir a realidade.»
Lídia Jorge habituou-nos, nos seus romances, a uma jovem que vê o mundo com uma certa ingenuidade ou inocência, muitas vezes perdida no final. Ana Maria, a Machadinha, como o próprio nome indica, revela-se uma surpresa na sua galeria de personagens, pois é uma mulher aparentemente fria, calculista, que desde o início do romance indicia não revelar tudo o que sabe (parecendo deixar a inocência para Margarida Lota). Este foi um processo consciente, pois essa figura ambígua fazia falta, como alguém que visse o mundo de forma lúcida e ao mesmo tempo amasse a realidade tal como esta se afirma.
Esta é provavelmente das obras da autora aquela que tem uma leitura mais fluída, quase ininterrupta, onde a linguagem é reduzida ao osso, ao essencial, num registo muito próximo da oralidade. Ver artigo
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