A Casa Ocupada, romance de estreia de Graça Videira Lopes, foi finalista do Prémio LeYa em 2022 e integra agora o catálogo das Publicações Dom Quixote. Ver artigo
O Jardim sem Limites, de Lídia Jorge, conhece agora a 5.ª Edição, pelas Publicações Dom Quixote. Romance de matriz urbana, cuja acção parte de um caso real e decorre em espaços reconhecíveis de Lisboa, publicado pela primeira vez em 1995, consolidou a carreira da autora algarvia, representa um dos seus mais ambiciosos trabalhos e concedeu-lhe o Prémio Bordallo Pinheiro de Literatura da Casa da Imprensa. Ver artigo
Requiem para o Navegador Solitário, de Luís Cardoso, publicado em 2007 (Publicações Dom Quixote), constitui uma crítica velada ao colonialismo por um autor em situação de diáspora, numa espécie de exílio autoimposto. Ver artigo
Fica uma amostra de um artigo a partir de uma comunicação sobre Olhos de Coruja, Olhos de Gato Bravo, de Luis Cardoso de Noronha – um livro extraordinário (em todas as acepções da palavra) publicado em 2001 pela Dom Quixote:
No dia do baptismo de Beatriz, a «aglomeração de gente» é tal que «o acontecimento antes de mais parecia o dia do juízo final», «um dia especial porque era o dia em que se comemorava a assunção de Nossa Senhora aos céus. Não era todos os dias que se poderia ter uma coincidênciadessas. Padre Santa dizia que, ou era desta que me baptizava e eu aproveitava a boleia da Virgem, ou eu ficava em terra e eternamente gentia. Estava lá mais gente do que ele esperava, inclusive pessoas que tinham morrido durante as guerras. Todos me queriam ver. Apresentaram-se com todos os apetrechos e alguns provavelmente tiveram de ir às aldeias mais remotas para recuperarem as respectivas partes corporais. (…) Os que não conseguiam colocar as respectivas cabeças nos seus lugares tinham-nas nas mãos. (…) Padre Santa fez então o louvor do labor do meu pai por ter mobilizado tanto catecúmeno, sendo que alguns vieram directamente das catacumbas.» (p. 114-115)
Padre Santa finalmente dá-lhe o nome de Beatriz e coloca-lhe uma venda nos olhos porque «eu já tinha visto tudo. Doravante não precisaria mais de olhos para ver.» (p. 116)
Mas depois repara «no lento aproximar da multidão dirigindo-se para o altar. Todos me queriam tocar e provavelmente me quereriam ver com olhos bem abertos. (…) E vendo que não paravam e temendo um rapto ou linchamento afastou-os, aos mortos com sal e água benta e aos vivos com a maldição do inferno.» (p. 116)
Há romances inesperados que nos tomam de assalto. E cuja riqueza só se revela quando ao tentarmos enrolar o fio da história este só se desenrola ainda mais, até nos guiar a labirintos que se adentram nos bosques de ficção. É o caso de A Última Morte do Coronel Santiago, de Luís Cardoso, publicado pela Dom Quixote (e infelizmente esgotado). Uma pessoa pensa escrever umas ideias sobre o livro em meia dúzia de páginas e, subitamente, apercebe-se que umas quantas dezenas são apenas o arranhar da superfície…
O adjectivo última remete-nos inevitavelmente para a ideia de fim, e a morte enquanto último destino na viagem da vida é uma constante no livro, como na passagem que nos remete para esse paraíso «depois da morte, quando se atravessa o mais estreito de todos os corredores, frio e escuro, antes de entrar no último comboio que atravessa um extenso túnel de luz.» (p. 54)
A ideia da morte sempre presente como a última viagem é reforçada poucas linhas depois, quando Lucas parece estar num delírio, ao acordar no hospital depois de um acidente que é determinante na sua vida, em que a sua mente deriva entre a ilha de Ataúro e o Entroncamento (para espanto de Clara, a médica), e expressa bem o desejo de morrer no sítio de onde partiu há cerca de 25 anos:
«- Quero morrer num outro sítio, tão distante que está a minha ilha de Ataúro. (…) Não quero que ninguém me veja defunto, nem chore penas e mágoas por um corpo que me serviu para fazer a travessia do tempo, entre uma margem e outra, deste mar que não sei onde acaba, desta vida que provavelmente acaba na cama onde estou deitado.» (p. 54-55)
O adjectivo última, patente no título, além de poder desconcertar o leitor pelo estranhamento de se referir uma última morte (como se alguém morresse várias vezes) remete ainda para a ideia de encerramento, o que se confirma no próprio livro, pois no fim do romance, para que não restem dúvidas da intenção do autor de encerrar aqui um “capítulo” da sua obra narrativa, poderemos ler «O Fim da Travessia». Uma frase que surge como uma espécie de epitáfio (ou epígrafe ao contrário), logo depois da última frase do romance, «O sol fazia-se anunciar.» (p. 293), como se fosse ainda uma última frase do livro – até porque não há qualquer espaçamento gráfico na página. Estas duas frases remetem para um álfa e um omega, como a serpente que se recolhe, enrolada em torno de si mesma, como um mundo narrativo perfeito autotélico que passa a existir eternamente fora do tempo.
Se voltarmos um pouco atrás, apenas 2 capítulos, poderemos ler, também, como Lucas ao regressar a Timor se demora por Díli conforme tenta fazer jus à bolsa literária que ganhou e que lhe exige dedicação exclusiva à escrita, mas continua sem conseguir «alinhavar sequer uma única frase» (p. 221). Saberemos ainda como «um amigo de longa data» lhe sugere, «por antecipação», um nome para esse livro ainda por nascer: «depois de ter lido em língua inglesa a tradução do seu primeiro romance que o título fosse.
«O Fim da Travessia.»
Assustou-se com esta sugestão. Ainda ficou a olhar para ele abismado. Era como se lhe tivesse anunciado a sua própria morte.» (p. 221)
Pois, num exercício perfeito de metaficção, a morte do livro é o fim do autor ou, por outras palavras, o fim do livro é a morte do autor.
O título do livro A Última Morte do Coronel Santiago parece ainda estabelecer uma relação intertextual com Crónica de uma Morte Anunciada, de García Márquez, o que não é de todo forçado se atentarmos na sombra omnipresente da morte ao longo do livro e no carácter extra-ordinário ou sobrenatural de alguns aspectos da narrativa.
Além de que, no final do livro, o protagonista a certa altura adormece e quando acorda apercebe-se que lhe vestiram a roupa branca que era do seu pai, sem nunca se perceber se é o traje do seu casamento ou simultaneamente o do seu enterro, até porque Lucas começa de facto a incorporar mais e mais o velho coronel Santiago, ao ponto de usar a sua cigarreira e inalar o rapé.
O Dia dos Prodígios é um dos livros mais importantes para mim. É uma das obras que eu trabalhei, durante mais de 8 anos, na minha vida académica.
É o romance de estreia de Lídia Jorge, uma das maiores autoras da Literatura Portuguesa contemporânea.
Foi publicado em 1980, por acaso no mesmo ano em que eu nasci, e na altura marcou uma grande mudança na literatura portuguesa, numa sociedade que também mudou com a Revolução do 25 de Abril.
Uma das personagens favoritas do romance, e de todos os romances que conheço, é Branca.
Branca está a bordar um dragão numa colcha branca mas começa a ter medo do desenho, pois sente o dragão a mover-se pela casa como um monstro, uma assombração. Como se todo o tempo e energia que ela gastou no bordado lhe tivessem conferido algum poder vital e dado vida: «Agora o dragão começa a ter uma forma de verdadeiro animal réptil voante. Porque o contorno da asa cinza vivo se abre em leque no meio do pano e o corpo do bicho de escamas miúdas. (…) Sendo potente e metalizado enrosca pelo tecido, e as patas abertas parecem agarrar seres vivos.» (p. 88).
É o romance de estreia de Lídia Jorge, uma das maiores autoras da Literatura Portuguesa contemporânea.
Foi publicado em 1980, por acaso no mesmo ano em que eu nasci, e na altura marcou uma grande mudança na literatura portuguesa, numa sociedade que também mudou com a Revolução do 25 de Abril.
Uma das personagens favoritas do romance, e de todos os romances que conheço, é Branca.
Branca está a bordar um dragão numa colcha branca mas começa a ter medo do desenho, pois sente o dragão a mover-se pela casa como um monstro, uma assombração. Como se todo o tempo e energia que ela gastou no bordado lhe tivessem conferido algum poder vital e dado vida: «Agora o dragão começa a ter uma forma de verdadeiro animal réptil voante. Porque o contorno da asa cinza vivo se abre em leque no meio do pano e o corpo do bicho de escamas miúdas. (…) Sendo potente e metalizado enrosca pelo tecido, e as patas abertas parecem agarrar seres vivos.» (p. 88).
Pesquisar:
Subscrição
Artigos recentes
Categorias
- Álbum fotográfico
- Álbum ilustrado
- Banda Desenhada
- Biografia
- Ciência
- Cinema
- Contos
- Crítica
- Desenvolvimento Pessoal
- Ensaio
- Espiritualidade
- Fantasia
- História
- Leitura
- Literatura de Viagens
- Literatura Estrangeira
- Literatura Infantil
- Literatura Juvenil
- Literatura Lusófona
- Literatura Portuguesa
- Música
- Não ficção
- Nobel
- Policial
- Pulitzer
- Queer
- Revista
- Romance histórico
- Sem categoria
- Séries
- Thriller
Arquivo
- Novembro 2024
- Outubro 2024
- Setembro 2024
- Agosto 2024
- Julho 2024
- Junho 2024
- Maio 2024
- Abril 2024
- Março 2024
- Fevereiro 2024
- Janeiro 2024
- Dezembro 2023
- Novembro 2023
- Outubro 2023
- Setembro 2023
- Agosto 2023
- Julho 2023
- Junho 2023
- Maio 2023
- Abril 2023
- Março 2023
- Fevereiro 2023
- Janeiro 2023
- Dezembro 2022
- Novembro 2022
- Outubro 2022
- Setembro 2022
- Agosto 2022
- Julho 2022
- Junho 2022
- Maio 2022
- Abril 2022
- Março 2022
- Fevereiro 2022
- Janeiro 2022
- Dezembro 2021
- Novembro 2021
- Outubro 2021
- Setembro 2021
- Agosto 2021
- Julho 2021
- Junho 2021
- Maio 2021
- Abril 2021
- Março 2021
- Fevereiro 2021
- Janeiro 2021
- Dezembro 2020
- Novembro 2020
- Outubro 2020
- Setembro 2020
- Agosto 2020
- Julho 2020
- Junho 2020
- Maio 2020
- Abril 2020
- Março 2020
- Fevereiro 2020
- Janeiro 2020
- Dezembro 2019
- Novembro 2019
- Outubro 2019
- Setembro 2019
- Agosto 2019
- Julho 2019
- Junho 2019
- Maio 2019
- Abril 2019
- Março 2019
- Fevereiro 2019
- Janeiro 2019
- Dezembro 2018
- Novembro 2018
- Outubro 2018
- Setembro 2018
- Agosto 2018
- Julho 2018
- Junho 2018
- Maio 2018
- Abril 2018
- Março 2018
- Fevereiro 2018
- Janeiro 2018
- Dezembro 2017
- Novembro 2017
- Outubro 2017
- Setembro 2017
- Agosto 2017
- Julho 2017
- Junho 2017
- Maio 2017
- Abril 2017
- Março 2017
- Fevereiro 2017
- Janeiro 2017
- Dezembro 2016
- Novembro 2016
- Outubro 2016
Etiquetas
Akiara
Alfaguara
Annie Ernaux
Antígona
ASA
Bertrand
Bertrand Editora
Booker Prize
Caminho
casa das Letras
Cavalo de Ferro
Companhia das Letras
Dom Quixote
Editorial Presença
Edições Tinta-da-china
Elena Ferrante
Elsinore
Fábula
Gradiva
Hélia Correia
Isabel Allende
Juliet Marillier
Leya
Lilliput
Livros do Brasil
Lídia Jorge
Margaret Atwood
Minotauro
New York Times
Nobel da Literatura
Nuvem de Letras
Pergaminho
Planeta
Porto Editora
Prémio Renaudot
Quetzal
Relógio d'Água
Relógio d’Água
Série
Temas e Debates
Teorema
The New York Times
Trilogia
Tânia Ganho
Um Lugar ao Sol