O Segundo Coração, de Bruno Vieira Amaral, publicado pela Quetzal, em novembro de 2022, reúne crónicas publicadas na edição online do semanário Expresso e na revista GQ. Ver artigo
Uma Luz Inesperada, com texto de José Saramago, é um álbum criado a partir de um fragmento de A Bagagem do Viajante (1973). Também com laivos autobiográficos, esta é a narrativa de como um Saramago-criança certo dia foi ajudar o tio a vender porcos na feira. Ver artigo
Entre outras iniciativas no âmbito do centenário de José Saramago, a Porto Editora publicou em maio deste ano dois livros ilustrados para os mais jovens. Ver artigo
Um livro incontornável, e não somente por ser publicado agora com a celebração do centenário do nascimento de José Saramago (1922-2022), Prémio Nobel da Literatura em 1998. Este pequeno grande volume de ensaios (em formato de bolso, embora com quase 400 páginas), essencial este ano e sempre, foi publicado pela Tinta-da-China. Ver artigo
José Saramago dispensa apresentaçõesde tal modo que esta nossa escolha pode até provocar surpresa. Autor de mais de 40 obras, nasceu em 1922, na aldeia de Azinhaga, e viveu até 2010, em Lanzarote. José Saramago construiu uma obra incontornável na literatura portuguesa e universal, sendo certamente uma importante referência para o nosso país em termos internacionais, com obras traduzidas por todo o mundo, e outras como Ensaio sobre a Cegueira, O Homem duplicado, ou A Jangada de Pedra, adaptadas ao cinema. José Saramago recebeu o Prémio Camões em 1995 e o Prémio Nobel da Literatura em 1998, e continua presente na nossa memória, sendo inclusive referência no chamado “cânone” literário, nos programas curriculares do ensino do Português: o Memorial do Convento figurou nos programas de ensino secundário, sendo agora substituído por O Ano da Morte de Ricardo Reis, escolha aliás que parece fazer todo o sentido, na medida em que se interrelaciona com os conteúdos programáticos do secundário, que abrangem a poesia pessoana. O autor já tem sido dado a conhecer até aos mais novos, com o seu belíssimo conto, A maior flor do mundo, cujos excertos figuraram aliás numa prova de final de ciclo do ensino básico. Entre diversos títulos que nos deixou, como Caim ou A Viagem do Elefante, os seus livros mais recentes e, diríamos, mais “ligeiros”, o autor deixou ainda obras de grande fôlego (e polémica), como o controverso Evangelho segundo Jesus Cristo.
São nove os títulos que regressaram neste último mês às livrarias, em edições revistas e com novas capas, que contam com o contributo de grandes figuras da literatura e cultura portuguesa: Siza Vieira, Baptista-Bastos, Eduardo Lourenço, Dulce Maria Cardoso, Gonçalo M. Tavares, Júlio Pomar, Lídia Jorge, Mário de Carvalho e Valter Hugo Mãe caligrafaram o título para a capa de cada um dos nove livros.
Mas cabe-nos, neste espaço, dedicar alguma atenção ao livro História do Cerco de Lisboa. O próprio título brinca com o leitor de forma irónica, ao jeito da pós-modernidade, ao anunciar uma História, quando não é, na verdade, um romance histórico embora seja o mais próximo de entre os romances de Saramago, aquele em que o discurso da História ocupa maior lugar. Problematizar o nosso conhecimento da História prende-se com a literatura pós-25 de Abril, numa subversão da verdade de uma História oficial pouco credível salazarista: «hábito de julgarmos tudo segundo ideias adquiridas, da nossa insaciável curiosidade apesar dos limites impostos ao nosso espírito, da inclinação que nos leva a encontrar mais analogias entre as coisas do que as que realmente têm» (pág. 14). Contestar o discurso oficial da História instaurado por regimes fascistas, atacando as definições e verdades em que essas “instituições” assentam, criando novas versões da História. Esta rasura é o que Raimundo faz ao escrever o Não no rascunho de que era revisor: o deleatur de que se fala no primeiro capítulo surge como metáfora deste processo que cria uma obra aberta onde a própria História parece dobrar o tempo e desacontecer ou, melhor dizendo, reacontecer de forma diversa.
Ao longo do romance, entrecruzam-se dois enredos: a versão romanesca que Raimundo Silva cria da História de Lisboa no século XII, que começa com um Não antes do verbo, baseada numa suposição errada, negando uma verdade histórica, ainda que a sua reconstrução histórica seja cuidada, realisticamente minuciosa, inclusive na linguagem da época, com exatidão histórica e detalhada; e noutro plano, o enredo que, no tempo presente, se centra no próprio processo da escrita e de como escrever História, instaurando um carácter profundamente metatextual da narrativa, onde se joga com três planos. Primeiro, a versão da História do Cerco de Lisboa criada pelo autor historiador apresentada na parte inicial, em que se conta a história do cerco de 1147, em que os cruzados ingleses chegaram a Lisboa, cidade ocupada então pelos mouros e que cinco meses depois se rendeu aos cristãos. Segundo, a Nova História do Cerco de Lisboa, criada pela personagem Raimundo Silva, onde se descobrem filões ou novas possibilidades, versões alternativas ou escondidas da verdade, na possibilidade de os cruzados terem ajudado o rei D. Afonso Henriques em troca do saque e do senhorio de terras conquistadas. O revisor pondera então a reação dos portugueses, do dito povinho (dos fracos e oprimidos) de que não reza a História. Por último, a nova versão da História instaura-se no próprio processo de escrita da mesma, devido ao peso da palavra; e a história de que o próprio narrador se apropria e recria, num palimpsesto e mise-en-âbime, que sintetiza as outras duas e que é aquela que o leitor tem nas mãos: «A cidade murmura as orações, o sol apontou e ilumina as açoteias, não tarda que nos pátios apareçam os moradores. A almádena está em plena luz. O almuadem é cego./Não o tem descrito assim o historiador no seu livro. Apenas que o muezim subiu ao minarete e dali convocou os fiéis à oração na mesquita, sem rigores de ocasião, se era manhã ou meio-dia, ou se estava a pôr-se o sol, porque certamente em sua opinião, o miúdo pormenor não interessaria à história, somente que ficasse o leitor sabendo que o autor conhecia das coisas daquele tempo o suficiente para fazer delas responsável menção.» (pág. 8).
O próprio revisor é incomum, à semelhança de outras personagens de Saramago, pelo gesto de infracção que comete, de rasura do passado, ao cometer um erro no seu trabalho, quando escreve o fatídico Não que altera tudo e dá propósito ao livro. O dito revisor, um homem na meia-idade, que vive à margem da sociedade, de forma simples, regrada, autómata, baça será, paradoxalmente, recompensado pela sua falha, tanto com uma promoção no trabalho, ao ser convidado a tornar-se autor, escrevendo a sua própria versão da história que antes revia, como pelo amor que esse ato de rebeldia chama à sua vida. E é desta forma que, por último, e a reforçar a inventividade de Saramago, surge ainda uma outra interpretação do título do livro, em que a palavra Cerco remete para o próprio ritual de corte, pois este revisor vai acabar por se apaixonar.
O título e tema do livro remetem-nos assim para outro assunto tão antigo quanto o tempo ou a guerra: uma metáfora do amor por uma mulher, e da conquista amorosa, cercando-a através da escrita: «Aturdido pelo contacto, Raimundo Silva levantou a cabeça, queria olhar, ver, saber, ter a certeza de que era a sua própria mão que ali estava, agora sim, o muro invisível desmoronava-se,
para além dele ficava a cidade do corpo, ruas e praças, sombras, claridades, um cantar que vem não se sabe donde, as infinitas janelas, a peregrinação interminável Ver artigo
Pesquisar:
Subscrição
Artigos recentes
Categorias
- Álbum fotográfico
- Álbum ilustrado
- Banda Desenhada
- Biografia
- Ciência
- Cinema
- Contos
- Crítica
- Desenvolvimento Pessoal
- Ensaio
- Espiritualidade
- Fantasia
- História
- Leitura
- Literatura de Viagens
- Literatura Estrangeira
- Literatura Infantil
- Literatura Juvenil
- Literatura Lusófona
- Literatura Portuguesa
- Música
- Não ficção
- Nobel
- Policial
- Pulitzer
- Queer
- Revista
- Romance histórico
- Sem categoria
- Séries
- Thriller
Arquivo
- Novembro 2024
- Outubro 2024
- Setembro 2024
- Agosto 2024
- Julho 2024
- Junho 2024
- Maio 2024
- Abril 2024
- Março 2024
- Fevereiro 2024
- Janeiro 2024
- Dezembro 2023
- Novembro 2023
- Outubro 2023
- Setembro 2023
- Agosto 2023
- Julho 2023
- Junho 2023
- Maio 2023
- Abril 2023
- Março 2023
- Fevereiro 2023
- Janeiro 2023
- Dezembro 2022
- Novembro 2022
- Outubro 2022
- Setembro 2022
- Agosto 2022
- Julho 2022
- Junho 2022
- Maio 2022
- Abril 2022
- Março 2022
- Fevereiro 2022
- Janeiro 2022
- Dezembro 2021
- Novembro 2021
- Outubro 2021
- Setembro 2021
- Agosto 2021
- Julho 2021
- Junho 2021
- Maio 2021
- Abril 2021
- Março 2021
- Fevereiro 2021
- Janeiro 2021
- Dezembro 2020
- Novembro 2020
- Outubro 2020
- Setembro 2020
- Agosto 2020
- Julho 2020
- Junho 2020
- Maio 2020
- Abril 2020
- Março 2020
- Fevereiro 2020
- Janeiro 2020
- Dezembro 2019
- Novembro 2019
- Outubro 2019
- Setembro 2019
- Agosto 2019
- Julho 2019
- Junho 2019
- Maio 2019
- Abril 2019
- Março 2019
- Fevereiro 2019
- Janeiro 2019
- Dezembro 2018
- Novembro 2018
- Outubro 2018
- Setembro 2018
- Agosto 2018
- Julho 2018
- Junho 2018
- Maio 2018
- Abril 2018
- Março 2018
- Fevereiro 2018
- Janeiro 2018
- Dezembro 2017
- Novembro 2017
- Outubro 2017
- Setembro 2017
- Agosto 2017
- Julho 2017
- Junho 2017
- Maio 2017
- Abril 2017
- Março 2017
- Fevereiro 2017
- Janeiro 2017
- Dezembro 2016
- Novembro 2016
- Outubro 2016
Etiquetas
Akiara
Alfaguara
Annie Ernaux
Antígona
ASA
Bertrand
Bertrand Editora
Booker Prize
Caminho
casa das Letras
Cavalo de Ferro
Companhia das Letras
Dom Quixote
Editorial Presença
Edições Tinta-da-china
Elena Ferrante
Elsinore
Fábula
Gradiva
Hélia Correia
Isabel Allende
Juliet Marillier
Leya
Lilliput
Livros do Brasil
Lídia Jorge
Margaret Atwood
Minotauro
New York Times
Nobel da Literatura
Nuvem de Letras
Pergaminho
Planeta
Porto Editora
Prémio Renaudot
Quetzal
Relógio d'Água
Relógio d’Água
Série
Temas e Debates
Teorema
The New York Times
Trilogia
Tânia Ganho
Um Lugar ao Sol