Jonathan Littell nasceu em Nova Iorque em 1967, cresceu nos Estados Unidos da América e em França, vivendo actualmente em Espanha. Venceu o Prémio Goncourt e o Grande Prémio do Romance da Academia Francesa com As Benevolentes, denso e imenso romance escrito em francês e publicado pela Dom Quixote em 2007. É ainda autor de diversas obras de não-ficção, sendo este Uma História Antiga o tão aguardado regresso do autor à ficção, igualmente publicado pela Dom Quixote.
Este romance parte, contudo, e daí o subtítulo Nova Versão, de uma sua novela publicada com o mesmo título em França em 2012, desenvolvendo e aprofundando neste romance ideias aí contidas.
Um narrador, em corpo de homem, sai de uma piscina, troca de roupa e começa a correr, até dar por si num novo cenário, semi-familiar, semi-desconhecido. Ao longo dos sete capítulos do livro, a narrativa estende-se com uma natureza obsessiva, com ecos e imagens que se tornam recorrentes. Uma escrita gráfica, que parece não esquecer nenhuma das mais diversas experiências sexuais, ricamente descritas, uma narrativa quase sem espaço para a ternura, onde também participa a violência, enquanto este narrador na primeira pessoa se desdobra em múltiplos eus e representa diversos papéis como quem veste a condição humana: ora mãe, ora prostituta, ora homem, ora andrógino.
É possível que a natureza do romance, labiríntico, não permita uma leitura de um fôlego só. Tal como o narrador, o leitor dá por si perdido em corredores e espaços que se desdobram invariavelmente de maneira idêntica, enquanto este narrador, ora num corpo de homem ora num corpo de mulher, ora adulto, ora criança, tacteia uma saída, apenas para se reencontrar num novo cenário moderno, invariavelmente cinzento, como a própria roupa que veste, enquanto vivencia situações que variam entre o doméstico e o orgíaco. Ver artigo
Mais conhecido como actor em cerca de 40 filmes, nomeado para um Óscar em 1984, Sam Shepard foi autor de mais de 40 peças teatrais e de 3 colectâneas de contos. Galardoado, em 1979, com o Prémio Pulitzer, finalista do prémio literário W.H. Smith e foi-lhe atribuído o doutoramento honoris causa pelo Trinity College, de Dublin, em 2012.
A narrativa de Espião na Primeira Pessoa inicia com o narrador a observar um homem de idade, um vizinho do outro lado da rua:
«Não tenho a certeza daquilo que ele está a ver agora, o ar está tão turvo, e também não tenho a certeza daquilo que estou a ver. Se está a falar de si para si ou se está a falar com outra pessoa ou o que está realmente a fazer. (…)
Come queijo e bolachas o dia todo. Chá gelado. Beberrica. Mas tem dificuldade com as mãos e os braços, dei-me conta disso. As mãos e os braços não trabalham muito.» (p. 21)
Capítulo a capítulo, o leitor percebe que o fio da consciência corre livre, entre memórias soltas, dispersas, incompletas mesmo, até perceber que afinal esse homem no alpendre da casa em frente é afinal o autor que se espia a si próprio. Como quem se vê à distância, como quem procura reencontrar-se, enquanto assiste ao deteriorar do seu corpo cujos gestos lhe fogem e cujo controlo lhe escapa:
«A coisa de que me lembro melhor é de me sentir mais ou menos desamparado e da força dos meus filhos. Um homem numa cadeira de rodas empurrado pelos filhos de um restaurante à cunha para uma rua vazia.» (p. 97)
Publicado pela Quetzal em Agosto de 2018, um ano depois da sua morte, este livro breve, em pequeno formato (como outros já aqui apresentados), de capítulos muito breves, é a despedida do autor, quase um epitáfio, ou uma revisitação da vida que está prestes a despir. O autor, vítima de Esclerose Lateral Amiotrófica e consciente da sua morte próxima, começou a compor em 2016 os rascunhos iniciais manuscritos, pois já não conseguia dactilografar, até que por fim passou a gravar e depois a ditar o texto, para ser posteriormente transcrito pelas suas irmãs. Ainda chegou a fazer a revisão final do livro com a família e a ditar a sua versão final dias antes de morrer, a 27 de Julho de 2017. O trabalho de edição e revisão do livro foi feito com ajuda da cantora e escritora Patti Smith, antiga amante do autor e sua amiga por mais de 40 anos. Ver artigo
A reler a obra O Jardim sem Limites, de Lídia Jorge (Dom Quixote), para ultimar um artigo.
Tal como a autora invoca recorrentemente, a propósito da personagem de Leonardo, o Static Man, a música de Einstein on the beach (1979), de Philip Glass, a par da alusão constante ao martelar das teclas na sua Remington, com a constante onomatopeica do clap clap clap, também eu me senti impelido, ainda mais por ser um amante da música deste compositor minimalista, a escrever exclusivamente ao som deste seu álbum. O que na verdade não é assim tão estranho, se eu confessar que Glass me acompanha e me serve de banda sonora há vários anos.
Quando me propus trabalhar a relação entre cinema e literatura, ocorreram-me diversas obras da minha escritora predilecta, como o óbvio A Costa dos Murmúrios, devido à adaptação ao grande ecrã por Teresa Cardoso, ou O Vento Assobiando nas Gruas, também extremamente visual, tendo já recebido várias propostas de uma realizadora e sido submetido a concursos, sem que depois se avance, aparentemente por falta de fundos . Contudo desde um primeiro momento que comecei a relembrar o impacto da leitura de O Jardim sem Limites sobre mim, talvez porque a recorrência de motivos na sua insistência quase obsessiva possa deixar realmente marcas no leitor, como um pulsar subliminar.
Esta é possivelmente uma das obras mais complexas da autora e que assinalou aliás a sua maturidade literária, ainda que não pareça ser a obra que mais impacto teve na crítica ou junto do público leitor. É um labirinto de múltiplas entradas, a que me interessa destacar a sua vertente metaficcional que se concretiza, também, na relação entre escrita e cinema, por diversas vias, como pretendo ilustrar no trabalho em curso… Ver artigo
Olhão no centro do mundo Ver artigo
John Berger (1926-2017), crítico de arte, pintor e escritor inglês, é considerado um ícone da contra-cultura e um dos pensadores mais influentes da actualidade. Exilou-se na França rural por mais de meio século como forma de escapar ao capitalismo e aos abusos do governo. Modos de Ver, agora publicado pela Antígona, foi escrito em 1972 e é o seu ensaio mais famoso, escrito na sequência do êxito obtido com a série homónima da BBC, transversal a vários públicos, e quase 50 anos depois permanece uma referência na crítica de arte como objecto de estudo dos académicos. Na «Nota ao Leitor» explicita-se, contudo, que o livro é produto de 5 autores: John Berger; Sven Blomberg; Chris Fox, Michael Dibb e Richard Hollis. Partindo de algumas das ideias contidas na série, aqui aprofundadas, o livro compõe-se de sete ensaios numerados mas que não implicam uma leitura sequencial. Três desses ensaios são visuais, isto é, compostos exclusivamente por imagens de obras de arte e a informação sobre as reproduções surge apenas no final do livro, para não «distrair o leitor do que aí se pretende enfatizar» (pág. 15).
No primeiro ensaio, um pouco mais genérico, aborda-se a imagem, nomeadamente na pintura, e a forma como esta comunica com o espectador, porque apesar de o acto de ver ser algo natural ao ser humano, e um dos primeiros sentidos a desenvolver, o olhar é um gesto voluntário, reflexivo, e enquadrado por aquilo que conhecemos e em que acreditamos: «Ver vem antes das palavras. Mesmo antes de saber falar, a criança olha e reconhece.» (pág. 17); «Só vemos aquilo para que olhamos. Olhar é um acto de escolha.» (pág. 18)
No terceiro ensaio (dos quatro ensaios compostos por palavras e imagens ilustrativas), aborda-se especificamente a nudez feminina na pintura e como esta serve a fruição estética e sexual de um espectador que se subentende masculino, além de que os produtores dessa arte foram eles próprios homens – seria aliás interessante contemplar a existência ou não de uma nudez no feminino representada por mulheres pintoras.
No sétimo ensaio, analisa-se como a sociedade contemporânea (relembre-se que falamos do início dos anos 70) vive rodeada de imagens como nunca antes aconteceu. A pintura outrora ao serviço das elites deu lugar a uma popularização da imagem publicitária que invadiu o nosso campo de visão e absorvem a nossa atenção mesmo que involuntária ou inconscientemente. É neste último ensaio que se sente a posição crítica de John Berger ao capitalismo e aos valores que passaram a ditar a sociedade, já prenunciados aliás com o mercantilismo e a burguesia que assistiu, e contribuiu, para a expansão da pintura a óleo como forma de representação do património e de um certo modo de vida daqueles que surgem retratados na arte.
Os vários ensaios deste interessantíssimo livro, escrito de forma escorreita, servem para olhar a arte de uma forma diferente da que tem sido prática, e daí a polémica destes ensaios, além de que se reconhece que o espectador ou observador de hoje não pode percepcionar uma obra de arte do modo como esta subentende o seu visionamento, através de pistas que o próprio pintor espalha pela imagem. Ver artigo
Ann Patchett nasceu em Los Angeles em 1963 e cresceu no Tennessee, onde continua a viver. Publicou o seu primeiro romance em 1992, destacado pelo New Yok Times como um dos melhores do ano. Tem recebido diversos prémios e encontra-se traduzida em mais de trinta línguas.
Bel Canto é um dos poucos romances da autora que se pode encontrar traduzido em português – assim Comunidade (Minotauro), já apresentado aqui – e foi publicado pela Gradiva em 2002, um ano imediatamente após a publicação do original. O romance parece ter passado despercebido por cá, mas recebeu os prémios Orange e Pen/Faulkner, e pode agora ser lido a propósito da adaptação cinematográfica que estreou recentemente nas salas de cinema portuguesas.
O livro começa com um beijo roubado na escuridão, um beijo invisível, mas que todos estão seguros de ter visto. Esse é o primeiro indício de uma estranha realidade que se começa a desenhar no romance, havendo até a sensação de que a narrativa vagabundeia um pouco até se centrar naquilo que se torna a intriga principal. Num país não nomeado da América do Sul, onde se fala espanhol e quechua, o Vice-Presidente dá uma festa na sua casa em honra de Mr. Hosokawa como forma de celebrar o seu aniversário, sendo Roxane Coss, cantora lírica americana, a estrela convidada como forma de aliciar este empresário a estar presente. Foi no seu décimo primeiro aniversário que Mr. Hosokawa foi levado pela mão do pai a ver o Rigoletto em Tóquio e desde então ficou apaixonado pela ópera, descobrindo depois, pela mão da filha que lhe oferece um álbum, a voz daquela que se considera ser a melhor soprano da época e que ele irá seguir incansavelmente ao longo dos próximos 5 anos, assistindo a 18 dos seus espectáculos: «a voz maravilhosa de Roxane Coss está a cantar Gilda para o jovem Katsumi Hosokawa, fazendo vibrar os ossos minúsculos dos seus ouvidos. A voz dela permanece dentro dele, transforma-se nele. Ela está a cantar aquela personagem para ele, e para mais mil pessoas. Ele é anónimo, igual aos outros, amado.» (p. 55)
Contudo, rapidamente o cenário de festa após o concerto se altera, quando os convidados são tomados como reféns por um grupo de guerrilheiros. Mais tarde, mulheres, crianças e alguns homens com a saúde mais debilitada são libertados, restando cerca de 50 reféns, mas os dias sucedem-se, até que duas semanas depois continua a não haver qualquer perspectiva de se superar o impasse deste rapto que começa a ganhar laivos surreais, em que os próprios reféns parecem preferir manter-se dentro daquela casa. O quotidiano na casa e as relações que se estabelecem entre os reféns e com os próprios raptores começam a afigurar-se uma metáfora da vida, à semelhança de Os Inconsolados, de Kazuo Ishiguro. Há alguns elementos pouco “realistas”, como Mr. Hosokawa e o seu intérprete Gen Watanabe, quase um assistente pessoal, serem estranhamente idênticos, na aparência e na voz. Gen Watanabe é o intérprete que estabelece a comunicação entre os diversos reféns, pois são de nacionalidades distintas e estão num país estrangeiro. Há guerrilheiros que revelam ser mulheres. A própria Roxanne Coss, que se julgaria ser a protagonista, dado o fascínio que exerce sobre todos, pela voz e pela presença que o seu canto irradia nela, só “entra em cena” já no terceiro capítulo, o que lembra a Turandot de Puccini, em que a princesa japonesa, apesar de omnipresente, apenas entra (que é como quem diz canta) na segunda cena. E não falta, principalmente nos primeiros capítulos, uma deliciosa ironia que denuncia a intrusão do humor da autora.
Este é um livro sobre o amor e a amizade, em que a música é enaltecida como alimento da alma e como uma magia capaz de quebrar as convenções do real: «Nunca tinha pensado, nem só uma vez, que pudesse existir uma mulher assim, uma mulher que estivesse tão perto de Deus que a voz Dele era decantada através dela. Quão fundo teria ido dentro de si própria para invocar aquela voz. Era como se a voz viesse do centro da Terra, e ela, só com um ligeiro esforço e com a diligência da sua vontade, conseguisse puxá-la através da terra, das pedras, pelo chão da casa, pelos pés, perpassando-a, pairando com o calor do seu corpo, até sair pelo lírio branco da sua garganta directamente para Deus lá no céu. Era um milagre, e a dádiva de o testemunhar fê-lo chorar.» (p. 59)
O filme conta com a interpretação de Julianne Moore e de Ken Watanabe. Ver artigo
Publicado recentemente pela Alfaguara, depois de Canção doce, publicado entre nós em 2017, este é o romance de estreia da autora, que obteve um imediato reconhecimento. Leïla Slimani nasceu em Marrocos em 1981 e aos 17 anos foi para Paris estudar Ciências Políticas, tendo trabalhado como jornalista antes de se dedicar à escrita.
É um romance perturbador, pela frontalidade da linguagem e pelo tema, mas com ressonâncias de clássicos como Madame Bovary ou Anna Karenina. Contudo o adultério é agora contado por uma mulher e o que em Flaubert era tédio burguês, aqui torna-se puro e manifesto desejo, aliás mais do que desejo, uma fome de sexo. Tão voraz como esse fogo que arde na protagonista, é a nossa própria leitura e a nossa própria ânsia de saber um desfecho que por experiência, e segundo a tradição literária, resulta mal.
Poder-se-ia ler esta obra como um libelo feminista de aceitação e glorificação do corpo e do prazer, não fosse Adèle estar num conflito entre si e o seu corpo: «o que excitava a alma era precisamente ser traída pelo corpo que agia contra a sua vontade, e, ao mesmo tempo, assistir a tal traição.» (pág. 104) Ainda que não pareça haver muito espaço para a culpa: « Adèle não retira nem glória nem vergonha das suas conquistas.» (pág. 105)
Uma obra citada em epígrafe, e referida a certa altura na obra, é A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, em que o protagonista coleccionava esgares de prazer em rostos de mulher, numa demanda insaciável por mais e mais mulheres.
Não se sabe se há redenção ou cura da ninfomania da personagem, mas é claro como em toda a narrativa a narradora se exime de emitir juízos de valor sobre o comportamento desta mulher, perseguida pela imagem que guarda de Paris quando tinha 10 anos, onde se confrontou com dezenas de prostitutas: «aquele sentimento mágico de ver claramente o vil e o obsceno, a perversão burguesa e a miséria humana.» (pág. 56) Ver artigo
Num cenário pós-apocalíptico, milénios depois de a Terra ser devastada por terramotos, erupções vulcânicas e a descida para sul dos glaciares, a espécie humana deixou de viver sobre o solo terrestre e todas as cidades, mesmo as metrópoles como Londres, sobrevoam o planeta, numa perseguição incessante, alimentando-se umas das outras, propulsionadas por engenhos de tracção, devorando e desmantelando as suas presas sob a mastigação de enormes mandíbulas hidráulicas.
A trilogia está agora a ser reeditada pela Presença e o filme Engenhos Mortíferos de Peter Jackson estreia dia 6 de Dezembro. Ver artigo
Hubert Reeves, astrofísico, ensinou cosmologia, e é um reconhecido divulgador da ciência, sendo a sua obra publicada em Portugal pela Gradiva. O seu mais recente livro é O banco do tempo que passa e pode muito bem ser a melhor forma de ficarmos a conhecer o autor e despertar a curiosidade pela sua obra. Como aliás indica Carlos Fiolhais num texto citado na badana do livro: «Este é o livro dos livros de Reeves: uma súmula dos seus conhecimentos e dos seus pensamentos sobre o Universo e sobre nós próprios.»
«Próximo da lagoa de Malicorne, em frente do grande salgueiro-chorão que se vê reflectido na água calma, instalámos um banco. Chamámos-lhe «o banco do tempo que passa». Sento-me nele com frequência para tentar apanhar o fiozinho do tempo que nos conduz ao longo de toda a nossa existência.» (pág. 13)
Este livro tem origem nos momentos de reflexão que o ilustre astrofísico experienciou frente a essa lagoa e é uma sequência de meditações mais ou menos dispersa mais ou menos organizada por temas caros ao autor, que o próprio leitor pode ir lendo sem linearidade ou compulsividade, tomando este livro como um guia ou um diário, impulsionando-o às suas próprias reflexões e divagações. Estas notas, umas vezes estendendo-se por 2 ou 3 páginas, outras limitando-se a uma frase ou a uma citação, são essencialmente pessoais, por vezes cruzadas com memórias do próprio cientista, onde este não só recupera ideias já abordadas nas suas outras obras como apresenta, em alguns momentos, breves sínteses. E apesar da sua formação empírica, o autor não descura um espaço para a religiosidade: «Entre os dogmas religiosos e as certezas ateias há espaço para as espiritualidades inquisitivas.» (pág. 92)
Destaca-se sobretudo a linguagem clara e simples, sem pretensiosismos nem complexificações científicas, e a capacidade de maravilhamento permanente perante o universo e a vida que o autor consegue transmitir ao leitor, nesta singela tentativa de «humanizar uma Humanidade que muito disso necessita.» (pág. 113) Ver artigo
Se atentarmos apenas no título, naquele breve momento de incerteza e de expectativa em que ainda tudo pode acontecer, este livro publicado pela Temas & Debates pode surpreender. Mas essa surpresa dever-se-á certamente a não termos lido com atenção o subtítulo do livro, pois aí fica claro o que irá acontecer: O poder das histórias que formaram os povos e as civilizações. Apesar de parecer um livro denso e pesado, onde não faltam diversas imagens, inclusive a cores, este livro engana ainda no modo como agarra o leitor e o faz atravessar quatro milénios de história através de dezasseis textos que são fundamentais para compreender a história da Humanidade, a cultura quer ocidental quer oriental, bem como a história da própria literatura. O próprio início do livro, quando Martin Puchner constrói todo um preâmbulo em torno da chegada do Homem à Lua, pode deixar o leitor a recear que toda a obra será uma enorme divagação, mas perceber-se-á depois que o autor tem um plano e que o “enredo” fará sentido a seu tempo.
O autor não se debruça portanto no papel da escrita, como actividade criativa e intelectual, mas sobretudo na forma como a leitura nos influencia e, principalmente, como as histórias que se escrevem e se recontam têm moldado o ser humano, o leitor, o potencial escritor. O próprio autor percorre alguns dos cenários das histórias que nos conta, como a mítica Troia, Sicília, Caraíbas ou Istambul, para falar com Orhan Pamuk.
Toda a erudição e conhecimento do autor são vertidos numa linearidade narrativa própria de quem conta uma história, ensinando-nos como o romance nasceu no Japão no século XI com Murasaki, uma dama de corte; como Miguel Cervantes combateu piratas quer marítimos quer literários; como Goethe pensa no conceito de literatura universal e como O Manifesto Comunista foi um livro que ganhou peso igual ao de outros textos fundadores, como a Bíblia; ou de que modo foram criados os suportes e objectos da escrita, como o alfabeto, o papel, o livro e a prensa.
Martin Puchner é titular da cátedra Byron e Anita Wien de Literatura Inglesa e Comparada, na Universidade de Harvard. É autor de livros premiados, cujas temáticas vão da filosofia às artes, como o Harvard xMOOC (Massive Open Online Course), que tem transmitido o fascínio pela literatura a estudantes de todo o mundo. Vive em Cambridge, Massachusetts. Ver artigo
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