Michel é um funcionário público quarentão do Ministério da Cultura, solteiro, cínico, apático, sem namorada ou amante, nem amigos íntimos. A sua vida reparte-se entre o trabalho, os peep shows (para limpar a mente) e os seus programas de televisão predilectos. A sua personalidade parece, portanto, condizer com a França aqui descrita: «um país sinistro, inteiramente sinistro e administrativo» (p. 54). Ver artigo
Michel Houellebecq é provavelmente dos autores franceses mais lidos e mais polémicos dos últimos tempos. Nascido na Ilha Reunião, em 1956, tem a sua obra publicada em Portugal pela Alfaguara e está traduzido em mais de quarenta línguas. Venceu em 2010 o Prémio Goncourt com O mapa e o território e este ano foi condecorado com a Legião de Honra, coincidentemente com a publicação do seu mais recente romance, Serotonina – título familiar, e infelizmente actual, para quem já se viu confrontado com a triste notícia de que o seu sistema endócrino não está a produzir serotonina suficiente.
Florent-Claude Labrouste, funcionário do Ministério da Agriculta, de quarenta e seis anos, descontente com o seu nome próprio e com a vida em geral, é um cidadão vulgar e anódino, não fosse ter uma namorada japonesa mais nova de quem descobre uns vídeos pornográficos chocantes para o leitor comum… Numa fuga à sociedade em geral, o nosso anti-herói deixa a namorada, a casa, o emprego e passa a viver de quarto em quarto de hotel, movido a Captorix, um antidepressivo que, supostamente, deveria libertar serotonina. Mas as melhoras são poucas, apesar de ironicamente serem bem manifestos os efeitos secundários como a total inibição de desejo sexual e a disfunção eréctil, mesmo quando a dosagem excede o que seria aconselhável. Ou, por outro lado, talvez seja o Captorix que lhe permitirá ver sem paliativos a realidade desastrosa e desesperançada que se vive, com uma França e uma Europa que ameaçam ruir, num mundo todo ele às avessas.
Politicamente incorrecta, com afirmações imbuídas de machismo e chauvinismo, a prosa de Michel Houellebecq raia o pornográfico ao mesmo tempo que ainda assim disseca, igualmente sem freio na língua, a nossa realidade. Para dar um exemplo mais suave, leia-se a seguinte passagem quando o narrador aceita ficar numa casa sem internet:
«Respondi-lhe que já sabia, que já estava preparado para isso. Vi então passar-lhe pelos olhos um breve momento de temor. Não devem faltar os depressivos que se querem isolar, que querem passar uns meses nos bosques «para fazer um ponto de situação»; mas pessoas que aceitam ficar sem internet, sem pestanejar, por tempo indefinido é porque estão nas últimas, li-lhe no olhar ansioso.
– Não me vou suicidar – disse-lhe, com um sorriso que esperava desarmante, mas que na realidade devia ser suspeito. – Enfim, não agora – acrescentei, como concessão.» (p. 221)
Florent-Claude Labrouste, funcionário do Ministério da Agriculta, de quarenta e seis anos, descontente com o seu nome próprio e com a vida em geral, é um cidadão vulgar e anódino, não fosse ter uma namorada japonesa mais nova de quem descobre uns vídeos pornográficos chocantes para o leitor comum… Numa fuga à sociedade em geral, o nosso anti-herói deixa a namorada, a casa, o emprego e passa a viver de quarto em quarto de hotel, movido a Captorix, um antidepressivo que, supostamente, deveria libertar serotonina. Mas as melhoras são poucas, apesar de ironicamente serem bem manifestos os efeitos secundários como a total inibição de desejo sexual e a disfunção eréctil, mesmo quando a dosagem excede o que seria aconselhável. Ou, por outro lado, talvez seja o Captorix que lhe permitirá ver sem paliativos a realidade desastrosa e desesperançada que se vive, com uma França e uma Europa que ameaçam ruir, num mundo todo ele às avessas.
Politicamente incorrecta, com afirmações imbuídas de machismo e chauvinismo, a prosa de Michel Houellebecq raia o pornográfico ao mesmo tempo que ainda assim disseca, igualmente sem freio na língua, a nossa realidade. Para dar um exemplo mais suave, leia-se a seguinte passagem quando o narrador aceita ficar numa casa sem internet:
«Respondi-lhe que já sabia, que já estava preparado para isso. Vi então passar-lhe pelos olhos um breve momento de temor. Não devem faltar os depressivos que se querem isolar, que querem passar uns meses nos bosques «para fazer um ponto de situação»; mas pessoas que aceitam ficar sem internet, sem pestanejar, por tempo indefinido é porque estão nas últimas, li-lhe no olhar ansioso.
– Não me vou suicidar – disse-lhe, com um sorriso que esperava desarmante, mas que na realidade devia ser suspeito. – Enfim, não agora – acrescentei, como concessão.» (p. 221)
Escreve Yuval Noah Harari, em Sapiens – De Animais a Deuses – História Breve da Humanidade, que «dinheiro, estatuto social, cirurgias plásticas, belas casas, posições poderosas – nada disto traz felicidade. A felicidade duradoura vem apenas com a serotonina, a dopamina e a oxitocina.» (p. 455)
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