Notas Sobre o Luto, de Chimamanda Ngozi Adichie, publicado pela Dom Quixote com tradução de Tânia Ganho, leva-nos ao fatídico ano de 2020, com o deflagrar da pandemia. Naquele que é o livro mais pessoal e intimista da autora, Chimamanda Ngozi Adichie faz-nos regressar aos rituais vividos durante o confinamento, como as reuniões familiares por videochamada, até que o seu próprio mundo soçobra. O académico James Nwoye Adichie, nascido em 1932, morre subitamente no dia 10 de junho de 2020, na Nigéria. A filha tinha-o visto ao vivo, pela última vez, a 5 de Março, «pouco tempo antes de o coronavírus ter mudado o mundo» (p. 97).

«A notícia é como um desenraizamento brutal. Sou arrancada à força do mundo que conheci desde a infância.» (p. 9)

Numa reflexão profunda e pertinente de uma época que nos marcou a todos um pouco por todo o mundo, em que à dor da perda se juntou o terrível limbo de as pessoas não saberem quando seria possível enterrar os mortos, ou terem de o fazer sem estar fisicamente presentes, para poder enterrar uma parte da sua própria dor, Chimamanda tece os fios da história da vida do pai até aos seus últimos dias, falando-nos, por exemplo, de como o namoro dos pais, em 1960, foi iniciado sem nenhum dos dois estar presente; apresentando-nos um pouco da cultura ibo; e reportando-se aos seus antepassados, como o pai do seu pai, vendido como escravo pelos próprios familiares a membros de outra etnia.

«O luto é uma forma cruel de aprendizagem. Aprendemos que a dor de perder alguém pode ser muito dura, cheia de raiva. Aprendemos que as condolências podem afigurar-se-nos completamente ocas. Aprendemos que uma grande parte do luto se prende com a linguagem, com o fracasso da linguagem e a busca de linguagem.» (p. 11)

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.