Os Altruístas é o aclamado romance de estreia de Andrew Ridker, publicado pela Quetzal, com tradução de Vasco Teles de Menezes. Descrito como um sucedâneo de Correções, de Jonathan Franzen, a verdade é que não só dei por mim a sentir algum saudosismo desse grande livro como reencontrei parte do prazer que tive ao ler Correções. Os Altruístas é uma saga familiar do século XXI mas também, de forma brilhante e irónica, uma reflexão sobre o que significa ser hoje uma boa pessoa.
Arthur Alter é um mediano professor universitário de Engenharia no Midwest que, apesar de passar a carreira a dar todas as disciplinas que lhe impingiam, nunca consegue chegar a efectivo, vê o seu contrato sempre renovado no último minuto, tem a casa hipotecada, e mal conhece os filhos, com quem quase não fala desde a morte da mulher. O seu escape para manter a sanidade mental, quando se apercebe de tudo a ruir em seu redor, é revisitar a sua única publicação de que só resta um exemplar numa biblioteca da sua universidade.
Francine Klein, a mãe, faleceu há 3 anos com cancro, e manteve segredo durante toda a sua vida de uma pequena fortuna que, no último momento, ao saber que o marido a traía com uma professora trinta anos mais nova, decide legar directamente aos filhos. Ethan, descrito na contra-capa como um jovem sensível e sexualmente confuso (na verdade Ethan é simplesmente homossexual), comprou e mobilou um apartamento caro em Nova Iorque onde vive em reclusão auto-imposta e imerso em leituras (para disfarçar a solidão), tendo-se despedido do bom emprego que tinha; depois de ter gasto o que recebeu da herança vive agora com uma dívida que lhe parece imaterial e por isso consegue ir ignorando. Maggie, seis anos mais nova que Ethan, é talvez a mais altruísta da família, num regime de pobreza autoimposta, sempre atenta à sua pegada ecológica, vivendo de pequenos recados em que procura ajudar os outros; Maggie recusa-se a mexer na herança que pretende doar na íntegra e desfalece de fome pelo menos duas vezes no livro, ao mesmo tempo que se empenha numa espécie de cleptomania ao estilo de Robin dos Bosques, em que furta aos que têm para depois redistribuir essa riqueza entre aqueles que precisam.
Ainda que este pareça um registo próximo do anedótico, a prosa de Andrew Ridker é límpida, irónica, compulsiva e subtil, traçando um retrato peculiar da sua geração e de uma sociedade «numa fase ainda tão imberbe» do novo milénio (p. 53), dissecando «a psicologia do consumidor» que é o motor da vida na América (p. 225). O autor é igualmente bem-sucedido em manter o ritmo narrativo ao mesmo tempo que recua até momentos-chave que lançam luz sobre o presente das personagens. Os Alter representam uma classe média-alta norte-americana completamente autocentrada (o patronímico parece sugerir justamente isso), que ainda assim procura não atrofiar o músculo da empatia ao mesmo tempo que procuram o seu lugar numa sociedade materialista; e gradualmente cientes que as suas boas intenções muitas vezes servem de arma contra aqueles que tentavam ajudar – sendo a experiência missionária de Arthur no Zimbabué um exemplo gritante.
Os Altruístas, recomendado pelo New York Times e pela Paris Review, foi já publicado em duas dezenas de países. Andrew Ridker nasceu em 1991; escreve para o The New York Times, Le Monde, Bookforum, The Paris Review Daily, Guernica e Boston Review, entre outras; dá aulas de escrita criativa.
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