Medir o Racismo, Vencer as Discriminações, de Thomas Piketty, publicado pela Temas e Debates, traduzido por Artur Lopes Cardoso, é um ensaio com cerca de 100 páginas que se lê num ápice, pela clareza do discurso e pelo encadeamento lógico dos argumentos. O aclamado autor francês de O Capital no Século XXI (2014), professor catedrático e codiretor do World Inequality Lab, parte da actual situação daquele que é o seu país para propor um novo modelo francês, mas também europeu, transnacional, universalista, de luta contra as discriminações. Piketty tem em conta o que se passa na Europa, mas também em países como os Estados Unidos ou a Índia, de modo a evidenciar como, apesar de muitas nações se terem construído sobre múltiplas mestiçagens, se tem alimentado, nomeadamente pela extrema direita, um discurso de “repúdio radical da diversidade das origens e das tradições culturais, religiosas ou relativas ao vestuário, reforçada pela perceção distorcida de uma minoria acusada de beneficiar de todos os privilégios e roubar os empregos e salários dos autóctones” (p. 8).

O autor desmonta assim discursos de ódio e intolerância assentes numa visão errónea e distorcida da realidade, com exemplos práticos e informações concretas, assentes em dados e estudos, que põem a nu as políticas socioeconómicas discriminatórias, muitas vezes custeadas com dinheiro público, no acesso ao ensino e ao emprego. Por exemplo, o facto de alunos de meios desfavorecidos terem mais possibilidade de encontrar professores substitutos ou não titulares ou 45 % das agências de trabalho temporário se predisporem (desde que não haja registo escrito) a privilegiar perfis europeus (com base no nome ou apelido), preterindo o de outras comunidades.

O autor dedica este pequeno livro, repartido em cerca de uma dezena de capítulos breves, a meios e estratégias aparentemente muito simples que permitem medir o racismo e lutar contra as discriminações mediante uma política social e económica baseada no universalismo. Sublinha a importância de um debate amplo e profundo sobre o tema, e apresenta soluções concretas para medir e corrigir as discriminações em torno de um conceito de identidade que é em si mesmo uma fantasia – até porque muitas vezes desconhecemos inclusive o percentil das nossas ancestrais origens étnicas. Uma das soluções propostas é acabar com as armadilhas dos referenciais étnico-raciais de tipo anglo-saxónico, que funcionam de forma binária (onde se responde a quadrículas como Branco ou Negro) e perguntar, tão simplesmente, qual o país de origem dos progenitores.

Thomas Piketty, nascido em Clichy (França) em 1971, é professor catedrático na École des Hautes Études en Sciences Sociales e professor da École d’Économie de Paris. É autor de obras históricas e teóricas consagradas à relação entre desenvolvimento económico, distribuição da riqueza e conflito político. O seu trabalho evidencia a importância das instituições políticas, sociais e fiscais na dinâmica histórica da repartição da riqueza. Codiretor do World Inequality Lab e da World Inequality Database, é também um dos promotores do Manifesto para a Democratização da Europa. Deste autor, a Temas e Debates publicou o bestseller internacional O Capital no Século XXI, Por Um Tratado de Democratização da Europa (2017), Capital e Ideologia (2019) e Pelo Socialismo! (2021).

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.