Raízes Brancas, de Bernardine Evaristo, foi o segundo romance publicado entre nós pela Elsinore, em Junho de 2021, da autora vencedora do Booker Prize. Traduzido por Miguel Romeira, este é um romance provocador que reinventa a história, narrando um mundo às avessas, onde os negros escravizam os brancos.

Doris é uma criança branca, de cabelos loiros e olhos azuis, capturada e enviada da Europa para o Novo Mundo – uma terra distante e desconhecida, situada do outro lado do mar e de onde ninguém regressa. Tal como tantos outros da sua raça que caem nas malhas titânicas do Comércio de Escravos, Doris despede-se do seu nome, da sua língua, da sua terra, e não volta a ter notícias da família.

Sobrevive à terrível travessia da rota transatlântica, para acabar por ser vendida a uma família negra, rica e poderosa, e adaptar-se a uma nova vida de servidão e a uma cultura que não é a sua. Doris é então rebaptizada: Omorenomwara é o seu novo nome. Vive agora no Reino Unido da Grande Ambossa, pertencente ao continente da Áphrika, também conhecido como o Continente Soalheiro, pois ali faz um calor desgraçado. Mas Doris, agora escrava, soube, em tempos, o que é ser livre e sonha todos os dias com a fuga.

“Segundo os termos do meu acordo, era um cargo vitalício. Trabalhava de segunda a domingo, das 00:00 às 23:55, e tinha de estar sempre disponível para fazer horas extraordinárias (…)

Era a perfeita brancumba doméstica.” (pág. 38)

Quando surge finalmente a oportunidade, ela não hesita, mesmo sabendo que isso pode significar a morte.

Raízes Brancas é uma narrativa provocadora, imaginativa, satírica, com uma linguagem colorida e irónica, com vista a desconstruir a História, a nossa noção de identidade, e a arbitrariedade do que entendemos como factos. Neste mundo, onde os escravos são os europeus e os senhores são os africanos, Evaristo dá largas à sua imaginação assim como a uma fina crítica social e cultural, que não poupa ninguém, nem opressores nem oprimidos.

Bernardine Evaristo nasceu no sudeste de Londres, em 1959, filha de mãe britânica e pai nigeriano. Autora de uma obra que inclui romance, poesia, contos, teatro e crítica literária, a sua escrita é caracterizada pela experimentação, ousadia e subversão na forma e escolha de temas, onde desafia os mitos e preconceitos das diásporas africanas e das suas identidades.

O seu mais recente romance, Rapariga, Mulher, Outra foi, ex-aequo com Os Testamentos (Bertrand, 2020), de Margaret Atwood, o vencedor do Booker Prize 2019, e Livro do Ano do British Book Awards 2020.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.