Montanhas Douradas, finalista do Booker Prize, é o romance de estreia de C Zam Phang e está publicado pela Bertrand Editora.
Com a epígrafe «Esta terra não é a tua terra.», Montanhas Douradas conta a história única e improvável de Lucy e Sam, duas irmãs cujos «olhos em bico» as denunciam de imediato como estrangeiras, muito embora tenham nascido em solo americano. Aos doze e onze anos de idade, respectivamente, perdem os pais e partem numa viagem terrível em direção a um horizonte mítico – levando consigo apenas uma égua e um corpo em decomposição dentro de uma arca, cujas partes vão sendo semeadas pelas terras que elas atravessam. Uma boa parte desta narrativa revolve-se na verdade a explorar o solo, para enterrar, para prospecção de ouro, para reencontrar a sua história ao mesmo tempo que deixam partes de si para trás, como uma trança de cabelo. Na terra dos sonhos dourados, as duas meninas lutam constantemente contra o preconceito – quando Lucy se revela ser inteligente perante o seu professor, tal é visto como insólito e merece ser estudado –, mas muito especialmente com a sua condição enquanto mulheres – é sabido (e objecto de outros romances) que, durante a corrida ao ouro na América, houve mulheres que se travestiam como homens (e raparigas como Sam que se fazem passar por rapazes).
«Sam parece hesitante. Recua, mas o círculo aperta-se de novo, encurralando-a. Os rapazes trepam pelo carvalho seco com os braços carregados. Lançam. Uma flor carnuda abre-se na bochecha de Sam. A árvore dá pedras, não frutos.» (p. 107)
A intriga de Montanhas Douradas, contada numa prosa sucinta, requerendo a dedicação de uma leitura atenta e pausada, e numa linguagem cadenciada, próxima da poesia em alguns momentos, torna-se ainda mais excepcional pela natureza multifacetada do romance: romance fantástico com laivos góticos, western, fábula. Teme-se a presença de um tigre em solo californiano, cujas pegadas e rugidos se podem tocar e ouvir, ao mesmo tempo que a história murmurada dos mortos nos chega soprada pelo vento.
«Como milhares de outros, achou que a erva amarela desta terra, o seu brilho de moedas sob o sol, prometia recompensas ainda mais cintilantes. Porém, nenhum dos que vieram escavar o Oeste contaram com a sede crestada da terra, com a forma como iria beber o seu suor e as suas forças. Nenhum deles contou com a sua avareza.» (p. 22)
Nesta terra de foras-da-lei, cowboys, mestiços, índios, negros, os chineses chegam às centenas em barcos, mas a quem era negado qualquer direito sobre o ouro por serem estrangeiros, da mesma forma que nas fotografias tiradas para os livros de história não aparecem os principais construtores do caminho-de-ferro. Sem raízes, Sam e Lucy, montadas nos cavalos Irmão e Irmã, procuram assim o futuro, sem perceber o que é isso de Oeste, errando entre as montanhas e o oceano, para encontrar um lugar no mundo.
A própria autora se apresenta como à procura de um lar. Nascida em Pequim, criada nos Estados Unidos, com nacionalidade norte-americana, C Zam Phang morou em treze cidades e quatro países. Actualmente reside em São Francisco.
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