As Mãos do Meu Pai, de Deok Kyu Choi, publicado pela Orfeu Mini, com tradução de Na Young Jung, é um belo e delicado álbum infantil. Uma história que se conta praticamente sem texto, onde as imagens falam por si. Este livro representa a estreia do autor na colecção Orfeu Mini, e foi vencedor no prémio Bologna Ragazzi 2022, com uma Menção Especial Não-Ficção.
«As mãos do meu pai são mãos grandes.»
A narrativa visual alterna entre a história de um pai e um filho, contada a dois tempos. A do pai com o seu filho recém-nascido, e a história dele próprio, pai, quando filho. Nas ilustrações, a acentuar o carácter geracional e a passagem do tempo, ressaltam pormenores, como o relógio de pêndulo e o calendário.
Um livro que nos fala sobre cuidar do outro, da mesma forma que cuidaram de nós, das mãos que nos alimentaram, tal como nós alimentamos aquele que nos sucede, das mãos que nos lavaram e vestiram e calçaram, como um dia alguém o fez connosco.
São as mãos que aqui mais falam, a relembrar da importância do toque e do amparo.
Esta é a narrativa pessoal, em formato de álbum, inspirada na relação do autor com o seu pai, e um convite à reflexão sobre as nossas famílias, sobre a parentalidade e a herança intergeracional.
Uma história que me faz recordar as mãos do meu pai. As mãos de um homem que eu raramente via, enquanto cresci. Do que me recordo bem era de quando chegava à hora de almoço (nunca o víamos ao jantar) e ia para a casa-de-banho, onde lavava as mãos, negras, gretada, ásperas, de unhas ou negras ou amareladas. Ele debruçava-se junto à banheira e com detergente da roupa espalhado nas palmas das mãos – também elas negras, de veios escuros onde outrora figuravam as linhas brancas do destino – tentava retirar alguma da sujidade, do óleo, do labor. Era sobretudo assim que eu o via, quando chegava com o seu macacão da oficina enegrecido e as mãos de quem trabalhava todos os dias, menos ao domingo. Era também ao domingo que tinha oportunidade de ver as suas mãos na bancada da cozinha, a martelar sapateiras e a arranjar marisco. Era o único dia em que se sentava connosco para jantar. E, por vezes, com sorte, eram também essas mãos que me descascavam algum camarão, ou me cortavam uma fatia de queijo, enquanto ele resmungava que eu, adulto, já não tinha idade para aquele tipo de delicadezas. É sobretudo pelas mãos que recordo o meu pai. Dos raros momentos em que com elas, mesmo quando sujas do trabalho de mecânico, me tocava enquanto me abraçava ou beijava, na despedida. Mas muito especialmente quando, naquela rara oportunidade, sentados à mesa da cozinha, ele me oferecia algo na ponta dos dedos. Foram essas as mãos que me deram um futuro.
Deok Kyu Choi é um premiado autor coreano de álbuns ilustrados e banda desenhada. Estudou pintura ocidental na Universidade Nacional de Seul e é hoje diretor de produção na editora Yun Edition.
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