Depois de um ano de 2016 particularmente generoso para Amos Oz, o escritor israelita mais lido no mundo, com a estreia no cinema da adaptação de Uma História de Amor e Trevas e com os prémios com que Judas foi distinguido, a Dom Quixote lança este conjunto de oito narrativas breves mas interligadas onde as personagens principais de uma história podem depois aparecer breve e indirectamente retratadas noutra.
O autor regressa ao espaço onde começou a escrever, fazendo de um kibutz (uma comunidade em Israel baseada no trabalho colectivo e na assistência mútua) durante os anos 50 a verdadeira personagem principal deste livro. As narrativas entretecem-se de modo a retratar a realidade múltipla e complexa de um espaço que se quer uno e uniforme onde, apesar de se viver numa comunidade fechada e essencialmente colaborativa, a solidão é ainda assim uma constante aparente no seio das várias personagens que deambulam nestas páginas.
Apesar de o livro tomar o título a partir de uma das histórias do livro, é na narrativa seguinte, sobre o jovem Moshe e o seu trabalho num galinheiro, que melhor se pressente alguma intenção crítica do autor em relação à descrição da vida no kibutz, onde se parece estabelecer uma comparação indirecta entre as galinhas presas nas gaiolas e os habitantes de um espaço fechado como o kibutz: «nunca houve nem haverá entre as galinhas duas exactamente iguais. A nós pareciam-nos todas iguais, mas elas diferem umas das outras tal e qual os seres humanos pois, desde a criação do mundo, ainda não nasceram duas criaturas perfeitamente iguais. No seu íntimo, Moshe já decidira que um dia seria vegetariano e talvez até vegan, mas resolvera adiar a concretização da decisão, porwque não é fácil ser vegetariano na companhia dos jovens do kibutz» (p. 66). As experiências pessoais parecem assim anular-se à sombra de um sonho colectivo, onde é inevitável abdicar da liberdade, pois querer vincar a nossa vontade só pode ser um acto egoísta.
A própria diversidade de pontos de vista, de uma narrativa e de uma personagem para outra, permite complexificar a problemática do kibutz e da ideologia que representa, sendo que o seu futuro parece aliás ameaçado: «Daqui a vinte ou trinta anos os kibutzes não serão mais que bairros ajardinados e os seus habitantes proprietários de casas satisfeitos.» (p. 161).
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