A História de Roma, de Joana Bértholo, editado o ano passado pela Caminho e, entretanto, já reeditado, é um romance sobre duas pessoas, outrora um casal, que se encontram dez anos depois de se terem separado. Numa prosa lírica, fluída, ensaística, reflexiva, o romance reparte-se, entre um solstício e um equinócio, ao longo dos dez dias em que se tentam reencontrar – até à revelação final que leva a encaixar as peças.

Após ter-se apaixonado por ele em Buenos Aires ainda antes de o ter conhecido – como se o enamoramento fosse indestrinçável do processo de desvendar os meandros de uma cidade –, é agora ela, lisboeta, que lhe serve de guia. Enquanto conduz este estrangeiro por diferentes percursos na sua cidade, entre ruas e locais, desenredam o fio das suas memórias. Mas, tal como em tempos se desencontraram como amantes, ainda que se voltem a deparar em geografias improváveis – Buenos Aires, Berlim, Marselha, Beirute –, também as suas memórias parecem irreconciliáveis ou talvez ela o tenha ficcionado demasiado. A última cidade será Maputo – tendo este livro resultado também de uma residência literária na capital moçambicana.

Porque amar uma cidade é também habitar o coração de um lugar, A História de Roma é afinal uma narrativa sobre o Amor (anagrama de Roma) nos tempos de hoje, assim como a história da filha que nunca chegaram a ter.

É fácil confundir autora e narradora, pois ambas partilham o nome, o ofício da escrita, e a errância por diversas cidades, neste romance que fala da geografia do amor, da vida no novo século, de decisões mais sensatas em prol da ecologia (nomeadamente não ter filhos), de uma vida dedicada à criação versus a maternidade e/ou um quotidiano feito de convenções. Um texto de autoficção que trabalha magistralmente questões controversas e delicadas que podem tocar particularmente a geração dos millenials, em especial na forma como se contrapõe a maternidade à criação artística – reforce-se que o livro é intitulado como a história (do nome) da criança que nunca nasceu, filha de dois pais artistas.

A escritora Joana Bértholo tem realizado uma série de conversas sobre o seu mais recente livro em vários pontos do país (Braga, Guimarães, Porto, etc.)

Depois de no dia 24 de fevereiro ter estado em Olhão numa sessão com Ana Isabel Soares, na Biblioteca Municipal José Mariano Gago, a autora estará em Faro.

Na Biblioteca Municipal de Faro António Ramos Rosa, Joana Bértholo dinamizará «O Museu do Pensamento», atividade prática e didática para pais e filhos (maiores de 8 anos), sendo obrigatório levar um chapéu.

Também na Biblioteca de Faro, no âmbito da celebração do seu XXII Aniversário, decorre uma conversa com a autora, moderada pelo Prof. Dr. Pedro Quintino de Sousa.

«Somos ubíquos, além-fronteira, uma das primeiras gerações cibernéticas. Éramos miúdos à entrada de Portugal na CEE, atingimos a maioridade com a viragem sincrónica do século e do milénio e quisemos ser do mundo:  fomos bolseiros dos programas Erasmus, Leonardo, InovArte, SVE. Fizemos au-pair e interrail.  Desfrutámos de mobilidade facilitada como nenhuma geração antes, viajámos em compartimentos mínimos, dormimos em tendas na praia e na garagem de alguém, surfámos sofás gratuitos e as nossas emissões de carbono nunca nos perdoarão os anos passados a abusar dos voos low-cost. Mantemos amantes em capitais vizinhas, romances sazonais vividos em fins-de-semana pendulares. Amamos em várias línguas.» (p. 168)

Joana Bértholo nasceu em Lisboa, em 1982. Conciliou a formação em design de Comunicação, e depois em Estudos Culturais, com uma série de viagens – cidades europeias e sul-americanas, onde viveu entre alguns meses e alguns anos. É autora de Diálogos para o Fim do Mundo, O Lago Avesso, Ecologia, Havia – Histórias de Coisas que Havia e de Outras que vai Havendo, Inventário do Pó, O Museu do Pensamento. Todos publicados pela Editorial Caminho.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.