Tentação do Norte, de Manuel Alegre, é uma pequena novela, publicada pela Dom Quixote, que assinala o regresso do autor à ficção depois do romance Tudo É e Não É (2013). Tentação do Norte, que chegou às livrarias em meados de Outubro, é um pequeno livro de cerca de 50 páginas que se lê como um poema em prosa.

«Sinto uma necessidade urgente de partir para o Norte. É estranho, tive, desde sempre, a tentação do Sul, uma irremediável saudade de tudo o que fica no Sul, se não mesmo no sul do Sul. Mas hoje acordei com a incontida pulsão de partir para o Norte. Como se tudo dependesse dessa partida, ou viagem, ou busca, seja lá o que for. E sem ao certo saber porquê nem de quê. Sei que algo de insubstituível está lá. Talvez um pouco de mim. Talvez uma casa há muito abandonada. Talvez alguém.» (p. 7)

Assim inicia esta novela, de natureza indefinida: «esboço de um conto», «início de uma narrativa poética, ou quase» (p. 41), «tentação poética de encontrar-me contigo» (p. 44). A indefinição esbater-se-á, gradualmente, com a respiração poética e o ritmo compassado da prosa poética que distingue o autor, até se revelar uma carta a um tu, esse alguém depois nomeado. Mais perto do fim, cria-se um diálogo ininterrupto entre este narrador na primeira pessoa e a sua narratária. Neste vaivém entre ele, Alexandre (conhecido por Sasha), e ela, Ju, ganham forma os contornos de uma história de amor e de luta política, que cruza Portugal e Espanha, a PIDE e a ETA. Carregado de simbolismo, onde se sente o saudosismo de um exilado – esse desejo de regressar àquela «praia que, já sabes, é sempre ao norte do Norte» (p. 44) –, este livro, mais do que uma história de amor de um comunista que desafiou amar uma mulher sem pedir licença ao partido, é também um ajuste de contas com o passado político de um país.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.