Tenho andado a acumular livros da autora e agora em virtude do seu último livro, Karen, que será oficialmente publicado em Setembro, decidi-me a trazer vários livros comigo. Esta tarde li O Lago. É uma leitura simples, compulsiva, mas intensa. Há um labirinto de citações e referências cinematográficas e artísticas, em geral, que acredito que reflectem directamente os gostos da autora. As fontes que abundam na obra apontam, também, para um carácter metaficcional da própria escrita da autora nesta obra. As personagens têm nomes anglófonos, presumo que por alguma influência romântica e inglesa, e movem-se no mundo do teatro. Actriz, actor, director-autor da peça – formam um triângulo amoroso a que não está alheio também um certo jogo de duplo, pois o próprio actor foi escolhido em virtude de ser parecido ao director da peça, tendo-se entretanto tornado amigos e inclusivamente trocam mulheres entre eles. Aquilo que parece uma história de amor e de felicidade – se bem que Jane alerta-nos várias vezes de que não acredita em contos de fadas e mal consegue acreditar na sorte que está a ter – depressa se torna num daqueles thrillers psicológicos de “terror clássico”, onde numa casa junto a um lago rodeados de neve – o branco, o isolamento, o esquecimento propiciam a perda do eu nessa ilusão que se cria e que se assume – em que se fundem as fronteiras entre o eu e o outro que se procura assumir na peça, entre o criador e o mundo que cria em detrimento da realidade, entre o amado e o ideal da coisa amada. Deixou-me curioso…

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.