Este é um dos meus prazeres culposos. Penso que atraído pela publicitação da autora como a nova mestre do romance fantástico, na senda de Marion Zimmer Bradley, comecei a ler as trilogias – os seus livros saem sempre em conjuntos de 3 – de Juliet Marillier. A nova trilogia, de que este livro constitui o segundo volume, é em torno não de uma das de duas personagens – Blackthorn & Grim. Ler esta autora é um pouco como ouvir, digamos, Enya: a melodia é sempre a mesma ainda que mude um pouco a letra, por isso quando se volta ao universo da autora as histórias são familiares, sempre em torno de tradições célticas e contos de fadas. Esta trilogia e este livro em particular é diferente dos anteriores da autora visto que para já a protagonista não é uma jovem donzela inocente mas sim uma mulher já com alguma idade e marcada pela vida, pois sobreviveu à morte do marido e do filho e é movida por um desejo imparável de vingança, mesmo depois de ter vivido um ano horrivel numa prisão onde foi sujeita a atrozes humilhações, onde conheceu aliás Grim, essa personagem que como o nome indica é um pouco “disforme”, um homem de grande estatura e que é sempre confudido como um simples, um pobre de espírito, um brutamontes. O livro é ainda original pela sua estrutura tripartida, em que alternam as narrações feitas a partir da perspectiva de Blackthorn, Grim e Geiléis, a mulher que pede ajuda à mulher sábia. Esta estrutura resulta do facto de o leitor ir tomando conhecimento das diferentes histórias que se irão entrelaçar mais no final, pois cada uma das personagens esconde segredos e motivos próprios, além de que é particularmente enternecedor o modo como nos apercebemos dos sentimentos de Grim por Blackthorn, que continua sempre a recusar ver o inevitável, tanto na dedicação de Grim por si como dentro do seu próprio coração achando simplesmente que formam um duo forte em função das tristes circunstâncias que os juntaram.
A Torre de Espinhos é provavelmente o mais negro dos livros da autora neo-zelandesa, fazendo jus ao nome adoptado pela personagem – “Espinheiro negro”, uma curandeira que é também dona de um certo mau feitio e que prefere ser deixada em paz na sua antissocialidade, mas que padece um pequeno senão: não pode recusar qualquer pedido de ajuda que lhe seja feito. Negra é também a história que nos é contada ao longo das quase 400 páginas deste livro, de uma criatura enclausurada numa torre que não é nenhuma Rapunzel mas sim um monstro que atormenta a terra em redor com os seus lamentos durante todo o dia, além de uma maldição mais geral que ataca todos os habitantes daquele território e que os faz esquecer-se… «Quando, no início do Verão desse mesmo ano, se tornara evidente que havia alguém a viver na torre, e que esse alguém – ou alguma coisa – gostava de gritar do nascer ao pôr do sol, as pessoas não disseram nada de especial. A maldição fora, de facto, poderosa. Forte o suficiente para durar o tempo que fosse preciso.»
Uma maldição que justamente por fazer esquecer se arrasta há 200 anos sem que ninguém consiga romper a cerca de espinhos em torno da torre e libertar ou matar aquela criatura. Grim também ganha mais relevo nesta história e revela-nos segredos sobre o seu passado, que lançam nova luz e estima sobre o homem que acompanha fielmente a mulher sábia. A certa altura é bastante óbvio qual o desfecho da história, mas afinal a tarefa que Blackthorn se destina cumprir reserva ainda uma surpresa…
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