Mr. Loverman, de Bernardine Evaristo, traduzido por Miguel Romeira, é o terceiro romance da autora vencedora Booker Prize publicado entre nós pela Elsinore.

Barrington Jedidiah Walker, natural da ilha de Antígua, emigrou para o Reino Unido nos anos 1960, onde prosperou financeiramente mediante o arrendamento de imóveis.

Um negro distinto, que chama a atenção. Bem cuidado e bem vestido, sempre vestido de fato, educado e culto, com citações de Shakespeare na ponta da língua, Barry é um gentleman das Caraíbas e também um bom vivant. Casado há 50 anos com Carmel, tem duas filhas e um neto. Vive ainda na permanente companhia de Morris de la Roux, seu amigo desde os onze anos. O que as pessoas não sabem é que Barry mantém, em segredo, uma relação amorosa com Morris.

Aos 74 anos, o protagonista deste romance, enfrenta uma crise existencial, e sente-se determinado a finalmente assumir a sua homossexualidade e pedir o divórcio.

Mr. Loverman é um romance que poderíamos definir como uma comédia de costumes dos tempos modernos, mediante a perspetiva irónica, sagaz e crítica de Barry destes estranhos novos tempos. A história do coming out de um homem septuagenário capaz de lançar um novo olhar sobre a sociedade multiétnica ocidental, destruindo mitos e falácias culturais (muito ao jeito de Bernardine Evaristo) e expondo preconceitos antigos. Uma narrativa com uma linguagem viva e muito própria (que ganha novos cambiantes na leitura portuguesa com a excelente tradução de Miguel Romeira), cheia de ritmo, humor e subversão.

“- Não esqueçamos que, antes do cristianismo, a África Subsaariana tinha as religiões indígenas, cada qual com as suas crenças morais (…) Havia os Guerreiros Zandes, no antigo Zaire, os Berberes do oásis de Siuá, no Egito, o travestismo em Madagáscar ou o rito de iniciação dos rapazes no Benim. É isso o que toda esta problemática tem de mais perverso. Se África importou alguma coisa, não foi a homossexualidade, mas a homofobia, por influência dos missionários europeus, que viam a homossexualidade como um pecado. Veja-se o caso de Angola antes do colonialismo: os homossexuais eram aceites e não perseguidos. Foram os portugueses a criminalizar a homossexualidade.” (p. 275)

Bernardine Evaristo nasceu no sudeste de Londres, em 1959, filha de mãe britânica e pai nigeriano. Autora de uma obra que inclui romance, poesia, contos, teatro e crítica literária, a sua escrita é caracterizada pela experimentação, ousadia e subversão na forma e escolha de temas, onde desafia os mitos e preconceitos das diásporas africanas e das suas identidades.

O seu mais recente romance, Rapariga, Mulher, Outra, foi, ex-aequo com Os Testamentos (Bertrand, 2020), de Margaret Atwood, o vencedor do Booker Prize 2019, e Livro do Ano do British Book Awards 2020.

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Paulo Nóbrega Serra
Written by Paulo Nóbrega Serra
Sou doutorado em Literatura com a tese «O realismo mágico na obra de Lídia Jorge, João de Melo e Hélia Correia», defendida em Junho de 2013. Mestre em Literatura Comparada e Licenciado em Línguas e Literaturas Modernas, autor da obra O Realismo Mágico na Literatura Portuguesa: O Dia dos Prodígios, de Lídia Jorge e O Meu Mundo Não É Deste Reino, de João de Melo, fruto da minha tese de mestrado. Tenho ainda três pequenas biografias publicadas na colecção Chamo-me: Agostinho da Silva, Eugénio de Andrade e D. Dinis. Colaboro com o suplemento Cultura.Sul e com o Postal do Algarve (distribuídos com o Expresso no Algarve e disponíveis online), e tenho publicado vários artigos e capítulos na área dos estudos literários. Trabalhei como professor do ensino público de 2003 a 2013 e ministrei formações. De Agosto de 2014 a Setembro de 2017, fui Docente do Instituto Camões em Gaborone na Universidade do Botsuana e na SADC, sendo o responsável pelo Departamento de Português da Universidade e ministrei cursos livres de língua portuguesa a adultos. Realizei um Mestrado em Ensino do Português e das Línguas Clássicas e uma pós-graduação em Ensino Especial. Vivi entre 2017 e Janeiro de 2020 na cidade da Beira, Moçambique, onde coordenei o Centro Cultural Português, do Camões, dois Centros de Língua Portuguesa, nas Universidades da Beira e de Quelimane. Fui docente na Universidade Pedagógica da Beira, onde leccionava Didáctica do Português a futuros professores. Resido agora em Díli, onde trabalho como Agente de Cooperação e lecciono na UNTL disciplinas como Leitura Orientada e Didáctica da Literatura. Ler é a minha vida e espero continuar a espalhar as chamas desta paixão entre os leitores amigos que por aqui passam.